A conversa com Miguel Martins, presidente da Associação Ibérica de Turismo Interior (AITI), decorreu após a realização do I Congresso Mundial de Turismo Interior e depois de ouvir a análise e opiniões de diversos agentes do turismo, especialistas e académicos. Uma coisa é certa, seja visto de dentro ou por fora, “Portugal tem todas as condições para fazer do interior um polo turístico forte e sustentável”.
O interior do país entrou definitivamente na estratégia do turismo em Portugal. A pandemia trouxe uma nova visão relativamente a estes territórios e, fundamentalmente, ao que estes são capazes de proporcionar aos visitantes. Contudo, antes de olhar para quem visita estes territórios, torna-se fulcral olhar para quem neles vive (ou quer viver), trabalha, estuda ou tem uma qualquer atividade. Por isso, Miguel Martins presidente da AITI, diz que “o turismo no interior está a abrir portas para a inovação e o empreendedorismo”. E destaca: “O interior do país representa um conjunto de recursos com grande potencial, mas que ainda carecem de maior organização, promoção e investimento”.
Que importância possui o Turismo Interior como motor de desenvolvimento económico, social e cultural para Portugal e especialmente em regiões menos visitadas?
O turismo no interior de Portugal tem de ser uma grande aposta para impulsionar o desenvolvimento económico, social e cultural do país, especialmente nas regiões menos visitadas. Além de criar empregos e novas oportunidades de negócio, ajuda a fixar a população em zonas rurais, combatendo a desertificação e dando uma nova vida a estas localidades. Os visitantes trazem dinamismo à economia local, consumindo produtos regionais, gastronomia típica e artesanato, o que fortalece os pequenos negócios e incentiva a produção local.
Outro ponto forte do Turismo Interior é a valorização do património e das tradições. Com mais visitantes interessados, há um maior cuidado com a preservação de monumentos, aldeias históricas e festividades típicas, não se perdendo tradições que em muitos destes sítios, sem o turismo, vão acabar por se perder.
Além disso, distribuir melhor o fluxo turístico ajuda a aliviar a pressão sobre cidades como Lisboa e Porto, garantindo um turismo mais sustentável e equilibrado. Em vez de sobrecarregar os destinos mais procurados, podem descobrir lugares menos explorados, mas igualmente encantadores, melhorando a experiência para todos e reduzindo impactos ambientais.
O turismo no interior está a abrir portas para a inovação e o empreendedorismo, com novos negócios a surgir, como alojamentos rurais, experiências gastronómicas diferenciadas e atividades de aventura. Com a ajuda da tecnologia, estas regiões podem ganhar mais visibilidade e atrair um público cada vez mais interessado em descobrir novos destinos.
No fundo, apostar no turismo no interior é investir no futuro destas regiões, garantindo desenvolvimento económico, preservação cultural e um turismo mais sustentável. Com boas estratégias e promoção.
Pode afirmar-se que Portugal possui um Turismo Interior consolidado ou em consolidação?
Portugal tem um Turismo Interior em consolidação, mas ainda há um longo caminho a percorrer para que se torne um destino verdadeiramente estruturado e competitivo. Neste momento, mais do que um destino consolidado, o interior do país representa um conjunto de recursos com grande potencial, mas que ainda carecem de maior organização, promoção e investimento.
Mas houve avanços nessa consolidação?
Nos últimos anos, houve avanços significativos, com a valorização do património histórico, da gastronomia, do enoturismo e do turismo de natureza. Regiões como o Douro, Alentejo, Serra da Estrela e Trás-os-Montes e Centro de Portugal começam a atrair mais visitantes, mas muitas zonas do interior continuam pouco exploradas e com dificuldades em se afirmar como destinos turísticos sólidos.
Então, onde residem as dificuldades ou desafios?
O grande desafio está na transformação destes recursos dispersos numa oferta turística estruturada e coesa. É necessário melhorar infraestruturas, aumentar a capacidade de alojamento, criar experiências diversificadas e, sobretudo, promover estas regiões de forma mais eficaz. O interior de Portugal ainda sofre com a falta de acessibilidade e transportes, o que limita a sua atratividade para turistas nacionais e internacionais.
Projetos como o “Revive”, que aposta na recuperação de património histórico, e o crescimento do turismo rural e de aventura mostram que há um esforço para consolidar este setor.
No entanto, sem uma estratégia clara e contínua para transformar o potencial em realidade, o Turismo Interior continuará a ser um conjunto de oportunidades por explorar, em vez de um verdadeiro destino turístico.
Portugal tem todas as condições para fazer do interior um polo turístico forte e sustentável, mas ainda há muito trabalho a fazer para que este deixe de ser apenas um conjunto de recursos e se torne uma escolha clara para os turistas.
A(s) estratégia(s) necessária(s)
Que estratégias ou ações considera prioritárias para dinamizar o Turismo Interior em Portugal?
Para que o interior de Portugal se torne um destino turístico verdadeiramente atrativo e competitivo, é essencial adotar uma estratégia estruturada que vá além de medidas pontuais. No entanto, mais do que infraestruturas e investimentos, o fator decisivo para o sucesso do turismo nestas regiões são as pessoas que vivem nos territórios. São elas que guardam a identidade, a cultura e as tradições, tornando cada local único. Mais do que apenas o passado destas terras, os seus habitantes são também o futuro, e sem o seu envolvimento e valorização, o Turismo Interior dificilmente se consolidará.
A hospitalidade genuína, o conhecimento das histórias locais e a paixão pelo território são elementos que nenhum investimento pode substituir. As pessoas são as verdadeiras embaixadoras dos seus destinos e é a sua capacidade de bem receber que faz a diferença na experiência do visitante.
Por isso, é fundamental capacitar e envolver as comunidades locais no desenvolvimento turístico, oferecendo formação em hospitalidade, empreendedorismo e inovação. Quando os habitantes sentem que fazem parte da transformação da sua região, tornam-se agentes ativos na criação de um turismo sustentável e autêntico.
Além disso, para tornar o interior mais atrativo, é essencial melhorar as infraestruturas e acessibilidades, garantindo boas ligações rodoviárias e transportes públicos eficientes, pois sem criar oportunidades para que os habitantes possam vender os seus produtos, contar as suas histórias e partilhar o seu modo de vida, é o que realmente diferencia o Turismo Interior do turismo massificado das grandes cidades.
A digitalização e a inovação são igualmente essenciais para colocar o interior no mapa turístico, mas esta modernização só terá impacto se for integrada com o saber das populações locais. A criação de roteiros interativos, visitas guiadas digitais e experiências imersivas deve ser feita com a participação de quem conhece o território melhor do que ninguém. Ou seja, os próprios habitantes.
Por fim, é essencial que exista um trabalho coordenado entre municípios, empresas e comunidades locais, garantindo que o Turismo Interior não seja apenas uma soma de recursos dispersos, mas sim um destino consolidado, coeso e atrativo. Se as pessoas forem colocadas no centro do desenvolvimento turístico, o interior de Portugal tem todas as condições para se tornar um verdadeiro motor de crescimento económico, social e cultural. Afinal, são as pessoas que dão alma a um destino e que, no momento da receção, fazem toda a diferença na experiência do visitante.
Há, então, a necessidade de uma maior promoção e investimento na valorização do património cultural, natural e gastronómico no interior? Quem deve conduzir essa promoção e investimento?
A promoção e o investimento na valorização do património cultural, natural e gastronómico do interior de Portugal são extremamente necessários e devem ser conduzidos de forma assertiva e direcionada. O património dessas regiões é um recurso valioso que, se bem explorado, pode atrair turistas, revitalizar a economia local e reforçar a identidade das comunidades.
Para garantir que a valorização do património seja eficaz, é fundamental que a responsabilidade pela promoção e investimento recaia sobre as respetivas regiões de turismo em colaboração estreita com o setor privado. Esta parceria pode maximizar o impacto das iniciativas e assegurar que os investimentos sejam direcionados para áreas que realmente atendam às necessidades e potencialidades de cada região.
No que diz respeito ao financiamento, deveria haver um papel ativo do Turismo de Portugal na coordenação de esforços e no suporte a projetos que valorizem o património local. Esta entidade tem a capacidade de promover políticas e programas que ajudem a fortalecer o setor do turismo e a preservar a riqueza cultural e gastronómica do interior.
Além disso, as câmaras municipais e as organizações locais devem estar envolvidas na identificação de oportunidades e na implementação de iniciativas que realmente refletem a essência de cada comunidade. A participação da população local é crucial para garantir que as propostas sejam relevantes e sustentáveis.
As novas tecnologias podem contribuir para a promoção e valorização destas regiões?
As novas tecnologias são essenciais para a promoção das regiões do interior de Portugal, oferecendo uma série de vantagens para o desenvolvimento económico e turístico. No entanto, muitas dessas áreas ainda enfrentam desafios significativos relacionados com a falta de cobertura de redes, como Internet de fibra e ligações móveis, o que pode limitar a eficácia dessas ferramentas.
Embora a utilização de redes sociais e plataformas de marketing digital possa aumentar a visibilidade das regiões, permitindo a divulgação do seu património cultural, natural e gastronómico de forma atrativa, a falta de infraestrutura adequada torna essa promoção ineficaz. Para que as novas tecnologias possam ser úteis, é fundamental garantir que as infraestruturas necessárias estejam disponíveis, caso contrário, o investimento nessas ferramentas não trará os resultados desejados. Além disso, muitas aplicações e soluções tecnológicas são desenvolvidas sem um conhecimento profundo das realidades locais, o que pode levar à disseminação de informações incorretas ou inadequadas. Quando os turistas recebem informações sobre pontos de interesse, eventos ou ofertas gastronómicas que estão desatualizadas ou erradas, isso pode resultar em frustrações e desconfiança.
Para que as novas tecnologias contribuam verdadeiramente para a promoção das regiões do interior, é crucial que haja uma colaboração estreita entre as regiões de turismo, as associações locais e o setor privado. Esses atores devem esforçar-se para compreender as especificidades de cada território e investir em infraestrutura de redes, assegurando que as soluções tecnológicas sejam adaptadas às necessidades e realidades locais.
Assim, as novas tecnologias têm um potencial enorme para promover as regiões do interior de Portugal, mas é vital que sejam acompanhadas por investimentos em infraestrutura e um conhecimento profundo dos territórios. Apenas assim se poderá garantir que a promoção seja eficaz e que os visitantes tenham uma experiência autêntica e satisfatória.
PPP para o interior
Que papel podem e/ou devem desempenhar as políticas públicas e as autarquias no desenvolvimento de um turismo mais estruturado e atrativo no interior?
Para o desenvolvimento de um turismo estruturado e atrativo no interior de Portugal é crucial implementar um conjunto de políticas públicas que abordem de forma integrada as necessidades das comunidades locais e as potencialidades turísticas da região. Estas políticas devem ser orientadas para a criação de um ambiente favorável ao crescimento do turismo, incentivando a economia local e promovendo a sustentabilidade.
Em primeiro lugar, deve haver um investimento significativo em infraestrutura. A melhoria das acessibilidades, como estradas, transporte público e sinalização, é fundamental para assegurar que os visitantes consigam aceder facilmente às zonas turísticas. Além disso, a criação de boas condições de alojamento, que vão desde pequenas casas de turismo rural a hotéis, é essencial para acomodar os turistas que visitam a região.
A promoção do património cultural, natural e gastronómico é outra componente vital. As políticas públicas devem promover a preservação do património histórico e cultural, bem como incentivar iniciativas que celebrem as tradições locais. Isso inclui a organização de eventos, festivais e feiras que destaquem a gastronomia típica, artesanato e as práticas culturais da região, atraindo tanto visitantes como participantes da própria comunidade.
A formação e capacitação de recursos humanos são igualmente importantes. Investir na formação de profissionais do setor turístico garante que os visitantes tenham acesso a serviços de qualidade, enriquecendo a sua experiência. Programas de formação podem abordar áreas como atendimento ao cliente, gestão de hotelaria e promoção do património local.
Além disso, é essencial que haja um enfoque na sustentabilidade ambiental. Políticas que promovam o turismo sustentável, respeitando o meio ambiente e as comunidades locais, são fundamentais para garantir que as riquezas naturais e culturais sejam preservadas. Isso pode incluir iniciativas de ecoturismo, promoção de práticas de turismo responsável e sensibilização de turistas e residentes sobre a importância da conservação ambiental.
Por fim, a colaboração entre diferentes entidades, como Turismo de Portugal, regiões de turismo e autarquias, deve ser incentivada. Essa articulação permite a criação de uma estratégia unificada que maximize a promoção das regiões e fortaleça a identidade turística do interior como um todo. Ou seja, o desenvolvimento de um turismo estruturado e atrativo no interior de Portugal requer políticas públicas que invistam em infraestrutura, promoção dos territórios, formação profissional, sustentabilidade ambiental e colaboração estratégica. Desta forma, é possível criar um ecossistema turístico que beneficie tanto os visitantes como as comunidades locais.
Quais são, na sua perspectiva, os maiores desafios que o Turismo Interior enfrenta atualmente e como é que estes podem ser ultrapassados?
São vários. Desde logo, a falta de infraestruturas, uma vez que muitas regiões do interior carecem de boas estradas, transporte público adequado e sinalização apropriada, dificultando o acesso dos turistas. Ao nível da promoção e visibilidade do património cultural e natural dessas regiões muitas vezes é fragmentada e pouco coordenada, resultando em baixa visibilidade e conhecimento entre os potenciais visitantes.
No que toca à sazonalidade, o Turismo Interior, frequentemente, enfrenta picos de visitantes apenas em determinadas épocas do ano, o que pode levar a uma gestão ineficaz das ofertas turísticas e à sazonalidade dos negócios. Também a falta de
formação e capacitação de profissionais do setor turístico pode afetar a qualidade dos serviços prestados, impactando negativamente a experiência do visitante.
Depois, na sustentabilidade ambiental, o crescimento do turismo deve ser feito de forma sustentável, preservando os recursos naturais e culturais, o que representa um desafio em muitas regiões que ainda não têm políticas claras nesse sentido.
Outro ponto importante é que o interior de Portugal enfrenta problemas de despovoamento e envelhecimento da população, o que pode afetar a oferta de mão-de-obra e a dinamização das comunidades, além de enfrentar concorrência de destinos urbanos e litorais que têm uma maior visibilidade e infraestruturas mais desenvolvidas, tornando difícil atrair visitantes.
Como já referi, a baixa cobertura de redes de internet e telecomunicações em algumas áreas limita a capacidade de utilizar tecnologias de promoção e informação, dificultando a conexão com turistas em potencial.
E quanto à oferta, muitas regiões do interior apresentam uma oferta limitada de alojamento, restauração e empresas de animação turística, o que pode desencorajar visitantes que buscam experiências completas e variadas.
Finalmente, a falta de coordenação entre a oferta de territórios vizinhos é um desafio significativo. Uma abordagem colaborativa entre diferentes municípios e regiões pode potenciar a promoção conjunta de itinerários turísticos e experiências, atraindo mais visitantes e facilitando a criação de pacotes turísticos que valorizem a diversidade da oferta.
Para abordar esses desafios, e repetindo-me, é crucial uma abordagem coordenada entre o Governo, autarquias, setor privado e comunidades locais, que permita criar soluções sustentáveis e efetivas que melhorem a oferta e a experiência turística no interior de Portugal.
Despovoamento, falta de infraestruturas, escassez de investimento. São estes os principais desafios que o Interior enfrenta?
O interior de Portugal enfrenta desafios significativos que vão além do despovoamento, da falta de infraestruturas e da escassez de investimento. Embora estas questões sejam cruciais, é importante salientar que o verdadeiro problema pode não estar apenas na quantidade de investimento, mas na forma como esse investimento é direcionado e aplicado.
É verdade que chegam milhões de euros destinados ao desenvolvimento do interior, mas muitas vezes esses recursos são aplicados de maneira inadequada, sem atender às reais necessidades das comunidades e das iniciativas turísticas locais. Por isso, é fundamental repensar as estratégias de investimento, priorizando ações que realmente favoreçam a dinamização do turismo a médio e longo prazo.
Uma abordagem mais eficaz seria colocar maior investimento e decisão nas mãos de quem realmente trabalha o turismo, ou seja, os atores privados e quem conhece profundamente as especificidades e potencialidades das regiões.
Ao descentralizar a gestão dos recursos e permitir que os empresários e associações ligadas ao turismo tenham voz ativa na definição de projetos e iniciativas, será mais fácil alavancar o potencial turístico do interior.
Além disso, outros desafios que merecem ser destacados incluem a promoção limitada do património cultural, a sazonalidade turística, a falta de formação e capacitação de recursos humanos, e a necessidade de uma melhor coordenação entre os diferentes territórios para criar uma oferta turística coerente e diversificada.
A escassez de alojamento, restauração e empresas de animação turística em muitos destes territórios também contribui para uma menor apetência destes territórios para quem os visita.
A falta de mobilidade e acessos são frequentemente referidos como um dos maiores entraves ao desenvolvimento do interior. Como pode esta questão ser resolvida?
Quando abordamos o tema do turismo no interior de Portugal, é fundamental identificar claramente a região em questão, uma vez que as especificidades e desafios enfrentados por cada território podem ser bastante distintos. Por exemplo, Viseu, como um território de interior, possui características e oferta que não se podem comparar de forma direta às de localidades como Idanha-a-Nova ou Penamacor, as quais têm realidades diferentes em termos de oferta turística, mobilidade e recursos disponíveis.
A estratégia de desenvolvimento para os territórios de interior deve ser orientada pelas singularidades de cada região, incluindo a sua localização geográfica e a diversidade de produtos turísticos que oferecem. Um dos principais desafios que muitas destas áreas enfrentam reside na mobilidade. A criação de uma rede de transportes eficaz é essencial para garantir que os turistas possam aceder facilmente aos pontos de interesse, promovendo assim uma maior afluência ao interior, e ao mesmo tempo essa mesma rede facilita as comunidades residentes nesses territórios. Um exemplo positivo deste tipo de articulação é o trabalho que a AITI está a realizar em colaboração com a Flixbus, com o intuito de estabelecer ligações entre Castelo Branco, Termas de Monfortinho, Cáceres, Mérida, Badajoz, Portalegre, e novamente Castelo Branco. Iniciativas como esta não apenas facilitam a mobilidade, mas também promovem a interligação entre cidades e pontos turísticos, potencializando a visita a estes territórios.
Além disso, é crucial que se estabeleçam parcerias com empresas de transporte que operem nos territórios em questão, para que as soluções sejam verdadeiramente eficazes e sustentáveis. Caso se justifique, a implementação de subsídios nestas empresas, especialmente numa fase inicial, pode ser um investimento estratégico vital para assegurar a conectividade entre as diversas regiões do interior.
Em suma, a abordagem ao desenvolvimento do turismo no interior de Portugal deve ser multifacetada, considerando as especificidades de cada região e investindo em soluções de mobilidade eficazes. A articulação entre entidades públicas e privadas, bem como a promoção de iniciativas que melhorem as ligações de transporte, são passos essenciais para fomentar a valorização e o crescimento do turismo nas áreas interiores do país.
Olá vizinhos
A proximidade com territórios fronteiriços, especialmente com Espanha, é uma oportunidade para o Turismo Interior?
A proximidade com territórios fronteiriços, especialmente com Espanha, é, sem dúvida, uma oportunidade significativa para o Turismo Interior de Portugal. Embora nem todos os territórios consigam aproveitar essa proximidade da mesma forma, é vital para o desenvolvimento dos territórios de fronteira e mesmo para aqueles que estão mais afastados.
Um exemplo concreto é a área da fronteira de Monfortinho. Se olharmos para o lado espanhol, numa meia circunferência de cerca de 100 km, podemos encontrar cerca de 600.000 pessoas a residir nessa região. Em contrapartida, do lado português, a população é muito mais diminuta, rondando os 45.000 habitantes. Este contraste demográfico destaca a enorme oportunidade que existe para o turismo.
A diferença significativa no número de potenciais visitantes evidencia onde se encontra o nosso mercado. Portanto, é crucial desenvolver estratégias que captem esse público proveniente de Espanha e incentivem a sua visita ao interior português.
Além disso, a criação de uma infraestrutura de transporte acessível e eficaz entre os dois países é fundamental. As ligações devem ser facilitadas para que os turistas possam deslocar-se facilmente entre os destinos em Portugal e Espanha, ampliando assim o alcance das ofertas turísticas disponíveis.
Por isso, a proximidade com a fronteira espanhola apresenta uma oportunidade substancial para o turismo no interior, tanto para as regiões fronteiriças quanto para as áreas mais afastadas. É essencial aproveitar esta vantagem demográfica, desenvolvendo estratégias que promovam o interior português como um destino atrativo e acessível, capaz de captar o interesse dos potenciais visitantes que habitam nas proximidades, criando, inclusive, estratégias comuns entre os dois países de promoção e de produto integrado.
Existe já algum exemplo de cooperação transfronteiriça bem-sucedida que possa referir?
Um exemplo concreto dessa colaboração entre Portugal e Espanha no desenvolvimento de um produto turístico é a criação do “Land of Dragons”. Este projeto, promovido pela AITI, estabelece uma conexão entre várias localidades dos dois lados da fronteira que incluem Monsanto, Malpartida de Cáceres, Trujillo e Cáceres. O principal objetivo deste produto turístico é potenciar estes territórios ibéricos através da série de renome mundial “House of Dragons”. Através do projeto, busca-se não apenas revitalizar a oferta turística, mas também aumentar o número de noites de estadia nas regiões envolvidas. Este produto integra atrações culturais, património histórico e experiências únicas que refletem a identidade e a autenticidade de cada local. A interligação entre as localidades possibilita que os visitantes explorem um itinerário completo que abrange as tradições e a riqueza cultural dos dois lados da fronteira.
Esta iniciativa é um excelente exemplo de como a colaboração entre os dois países pode resultar em benefícios mútuos, promovendo as especificidades de cada região e criar sinergias que atraem turistas. Ao unir esforços e recursos, é possível expandir a visibilidade e a atratividade dos destinos envolvidos, contribuindo para um turismo sustentável e integrado que favorece o desenvolvimento socioeconómico de ambos os lados da fronteira.
Este produto, “Land of Dragons”, é um modelo a ser seguido, demonstrando como a cooperação transfronteiriça pode criar oportunidades significativas para o turismo no interior, ao mesmo tempo que promove um legado cultural rico e diversificado na península ibérica.
O desenvolvimento do turismo pode ser um fator crucial para fixar pessoas e negócios no interior. Como é que o turismo pode criar um ciclo positivo que beneficie a economia local e traga novas oportunidades de emprego?
O turismo pode criar um ciclo positivo que beneficia a economia local e traz novas oportunidades de emprego de várias maneiras. Primeiramente, a chegada de turistas gera uma maior procura por serviços e produtos locais, como restaurantes, alojamento, transporte e atividades de lazer. Essa demanda adicional incentiva o crescimento das empresas existentes e a criação de novas.
Com a expansão do turismo, surgem novas oportunidades de emprego em diversas áreas, como hotelaria, restauração, guias turísticos, transportes e comércio. Essas novas vagas ajudam a reduzir a taxa de desemprego na comunidade local e oferecem oportunidades de trabalho para diversos grupos, incluindo jovens e pessoas requalificadas.
Além disso, o aumento da atividade turística pode atrair investimentos para a região, tanto públicos quanto privados. Estes investimentos podem ser direcionados para a melhoria de infraestruturas, como estradas e transportes, bem como para o desenvolvimento de novos projetos turísticos, gerando mais empregos.
Recentemente realizou-se o primeiro Congresso Mundial de Turismo Interior, organizado pela AITI. Que conclusões ou linhas de ação foi possível retirar do congresso?
As conclusões do nosso congresso refletem a importância da colaboração entre Portugal e Espanha, bem como a necessidade de estabelecer estratégias conjuntas que potenciem o desenvolvimento de ambas as regiões.
Algumas das conclusões e linhas orientadoras que emergiram deste evento passam pelo fortalecimento da colaboração transfronteiriça; desenvolvimento de produtos turísticos comuns; promoção da mobilidade e acessibilidade; fortalecimento da identidade regional; capacitação e formação; inovação e sustentabilidade; estímulos e incentivos fiscais; e a importância da comunicação eficaz.
Em suma, as conclusões do congresso sublinham a necessidade de uma abordagem colaborativa e integrada para o desenvolvimento do turismo entre Portugal e Espanha. As linhas orientadoras estabelecidas contribuirão para guiar as ações futuras da nossa associação e dos profissionais do setor, assegurando que continuemos a fortalecer os laços entre os dois países e a maximizar as oportunidades de crescimento e desenvolvimento em ambas as regiões.
Olhando para o futuro, como vê o Turismo Interior em Portugal dentro de cinco ou 10 anos?
Sou um otimista por natureza, mas, infelizmente, a realidade que observo é alarmante. Existe uma enorme falta de vontade e determinação para implementar soluções eficazes no turismo do interior de Portugal. As dificuldades que o interior já enfrenta são consideráveis, e cada vez mais, quem detém o poder de decisão parece agir em contraciclo, realizando iniciativas que não apenas desconsideram as reais necessidades das regiões, mas que podem até agravar a situação.
A aproximação a Espanha é absolutamente fundamental para o crescimento do Turismo Interior. Na Extremadura espanhola, o número de turistas e residentes ronda os cinco milhões, representando uma oportunidade crucial que não podemos ignorar.
No entanto, é desanimador ver regiões portuguesas a gastar recursos em promoção para mercados tão distantes como os Estados Unidos e outros destinos que, na prática, não fazem sentido para muitos dos nossos territórios de interior. Essa priorização de mercados irrelevantes é um erro estratégico grave. Precisamos, urgentemente, de focar a nossa atenção nas necessidades e características específicas das regiões interiores. É frustrante observar que são investidos milhões em iniciativas que, na maioria das vezes, não têm um impacto positivo.
Com todos os problemas que enfrentamos, é vital que se utilize o dinheiro público de maneira responsável e com uma visão clara. A forma mais fácil parece ser a contratação de consultores externos, que, sem qualquer conhecimento profundo sobre a realidade do interior, acabam por propor soluções inadequadas e desconectadas da verdadeira situação dos nossos territórios.
O futuro do turismo no interior depende da nossa capacidade de estabelecer um plano de desenvolvimento estruturado e eficaz. Precisamos urgentemente deixar de lado esta visão limitada da fronteira e trabalhar em conjunto, sempre que possível, em termos geográficos. A ausência de colaboração entre os diversos atores locais, regionais e nacionais impede que se crie uma estratégia integrada capaz de valorizar as potencialidades do interior.