Falar de Enoturismo em Portugal faz com que, obrigatoriamente, se fale do Douro e do Alentejo. Acrescente-se quem desenvolve o negócio hoteleiro, focando-se, também, no Enoturismo, e o painel para abordar este produto turístico completou-se de forma ideal.
No Douro, Região Vitivinícola Demarcada mais antiga do mundo, Maria Manuel Ramos, diretora de Turismo da Sogevinus, começou por admitir que estar inserido nesta região é uma “grande vantagem. As caves de Vinho do Porto, em Gaia, ajudam muito à consolidação do Douro como destino de Enoturismo”, salientando, igualmente, que o Enoturismo “serviu e serve para fixar pessoas e criar emprego”.
Embora reconheça que a região do Douro é beneficiada pela proximidade do aeroporto Francisco de Sá Carneiro, a verdade é que “a estadia média do Douro ainda é muito baixa”, assinalando Maria Manuel Ramos que o turista permanece, no máximo, duas noites e regressa ao Porto. “O grande desafio está entre novembro e março. Quem visita a região encontra muitos restaurantes e até hotéis fechados, o que prejudica a atividade, enquanto Gaia e o Porto têm uma sazonalidade muito menos vincada”.
No Alentejo, Luísa Rebelo, general manager do Torre de Palma Wine Hotel, admite tratar-se de uma região que “ainda não está consolidada com o Douro”, frisando que “nesta indústria, não nos podemos acomodar e pensar que somos um destino consolidado ou que o trabalho já está feito, porque não está, há muito por fazer. É verdade que o Alentejo, a par do Douro, já é muito reconhecido, mas o Douro está um pouco à frente do Alentejo”, reconhece.
Contudo, não é na qualidade que o Douro está à frente, mas sim em termos de notoriedade, já que a região mais a Norte, “está no top of mind. O Douro ainda é o número 1 do Enoturismo em Portugal”, contribuindo para tal a presença de “marcas conhecidas a nível mundial”, seja na produção de vinho, seja na hotelaria.
Embora no Alentejo já existam exemplos de marcas que têm trazido “grande notoriedade à região”, Luísa Rebelo acredita que “há um caminho muito longo ainda a ser percorrido. Nestes últimos 10 anos, vimos um crescimento dos mercados internacionais, obviamente a par daquilo que tem acontecido em todo o país, com o mercado americano em destaque. Mas temos muito ainda a fazer, muito a fazer em termos de trabalho em rede, com todos os parceiros, até porque o Alentejo é uma região enorme, facilmente daria para passar duas semanas no Alentejo ao invés de duas ou três noites, que é o que acontece”.
Neste aspeto, a general manager do Torre de Palma não se importa de olhar para o Douro, mas também para as melhores regiões de Enoturismo a nível mundial, “ver porque são tão conhecidas e ir buscar exemplos para a nossa prática em Portugal”. E isto, “não por serem melhores, mas por serem diferentes e por se posicionarem no marketing e na promoção de uma forma mais visível”, dando como exemplo regiões como Mendonça, na Argentina, ou Toscânia, em Itália. “Se olharmos em termos de qualidade do que é feito em Portugal, estamos ao mesmo nível, às vezes até acima até, mas precisamos de dar um salto na notoriedade e visibilidade internacional”.
Com hotéis de Norte a Sul do país, incluindo ilhas, e no estrangeiro, o grupo Vila Galé possui o Enoturismo na sua génese, indicando Pedro Ribeiro, diretor de Vendas e Marketing do grupo, que “todas as nossas áreas de Enoturismo estão ligadas à produção de um vinho”, distinguindo, contudo, o que é Enoturismo com alojamento do Enoturismo somente para visita ou prova. “É mais difícil, hoje em dia, em termos nacionais, vender Enoturismo com alojamento do que vender Enoturismo só com visita”, afirma Pedro Ribeiro. E aqui, destaca o trabalho feito no Douro, onde a notoriedade e o prestígio internacional do Vinho do Porto “conseguiu angariar fluxos não só para a região, mas também para Gaia e a cidade do Porto”.
Daí a aposta do grupo liderado por Jorge Rebelo de Almeida pela criação da marca Vineyards, no Douro e Alentejo, com a terceira unidade a receber essa denominação a ficar localizada no Minho, na região dos Vinhos Verdes, com abertura marcada para o dia 25 de abril de 2025.
Contudo, Pedro Ribeiro admite que o mercado nacional “ainda precisa de ser educado” quando se fala de Enoturismo, já que “as pessoas sentem alguma dificuldade em envolver-se com este produto, como podem ter uma experiência enoturística que vai mais além de uma simples prova de vinho”, frisando que cabe à comunicação social, aos próprios agentes, ao Turismo de Portugal, às CVRs, a todo o ecossistema, esse papel de educar quem pretende visitar os enoturismos, referindo-se, igualmente, à rede que é preciso criar ou aprofundar para dar esse salto.
“Os próprios hotéis que não possuem Enoturismo, que são unidades de sol e praia, de city breaks, se tiverem essa multiplicidade de produtos para oferecer ao seu cliente, ao seu hóspede, também saem beneficiados porque oferecem um produto complementar e criam uma nova ou outra motivação para que as pessoas voltem ao destino”, salientou Pedro Ribeiro, dando como exemplo o Algarve que, apesar de ter no sol e praia o seu produto de excelência, “se conseguir complementá-lo com outra experiência, ajuda a uma estadia mais agradável e vai puxar o produto para cima”.
Eu enoturista sou
Assim, coloca-se a questão de saber o que o enoturísta procura, efetivamente? E se no Douro, Maria Manuel Ramos afirma que “procura saber um pouco mais de vinho, procura paz, tranquilidade, estar em contacto com a natureza, procura gastronomia”, o certo é que se trata de um turista com “um poder de compra mais elevado, que gasta um pouco mais acima da média”. Além disso, a diretora de Turismo da Sogevinus refere que o Enoturismo contribui, também, para “ajudar a dispersar os fluxos pelas várias regiões e cidades”.
Luísa Rebelo acrescentou às razões de visita também a “procura por experiências únicas e autênticas, para que possam levar algo inesquecível na memória e que partilhem, depois, com os amigos e família”. Além disso, também “o contacto com a cultura local, ou seja, com as nossas pessoas, com quem faz o vinho é valorizado, com o storytelling a assumir um papel cada vez mais relevante”. “Nas nossas provas de vinhos, apresentamos os queijos da região, os enchidos que são produzidos por determinada pessoa, alimentamos a envolvência com a comunidade e essa ligação e história são muito valorizadas por quem nos visita”.
No caso dos hotéis Vila Galé, Pedro Ribeiro admite “dificuldades de comunicação com a distribuição do Enoturismo”, reconhecendo que “não é tão fácil, como no lazer, onde temos operadores, OTAs, onde há uma forma de comunicar mais fácil. Encontrar parceiros internacionais especializados em Enoturismo é mais difícil. O que existe, são operadores generalistas que criam alguns programas de Enoturismo”.
Assim, o grupo decidiu comunicar e fazer essa ligação entre as três regiões (Alentejo, Douro e Minho), motivando alguns parceiros a promoverem estes pacotes. “Existem pessoas que procuram o Enoturismo só como um escape de fim de semana e não com o objetivo de fazer uma atividade ligada aos vinhos. Querem descansar, beneficiar do hotel, e, porventura, podem englobar o vinho”. Certo é que nos 33 hotéis em Portugal e nos 11 do Brasil, o grupo só serve os “néctares da casa”, vende os vinhos na receção, com os rececionistas a receberem, inclusivamente, formação para a venda de vinhos e promoção das restantes unidades, o que leva Pedro Ribeiro a assumir que “este crosselling está no ADN do grupo desde sempre”.
EUA ganham peso no Enoturismo
Abordada a questão dos principais mercados para o Enoturismo, os três participantes no painel foram unanimes em considerar os EUA, seguidos do Brasil, Reino Unido e alguns nórdicos como os de maior relevância. Reconhecendo tratar-se ainda de um “produto de nicho”, Luísa Rebelo admite que “nem todos vêm por causa do vinho, tal como quem vem para praia não vem obrigatoriamente para o surf ou para o golfe”, outros produtos considerados nicho, sendo certo que o Enoturismo é um mercado de “maior valor”.
Na Sogevnius, embora o mercado nacional seja, ainda, o principal, Maria Manuel Ramos destaca o espanhol, francês e britânico como relevantes, reconhecendo, no entanto, que “as políticas de bagagem das companhias aéreas não nos ajudam na venda de vinho”, como shipping de vinho a conhecer números simpáticos.
E as novidades da Sogevinus conhecerão um novo capítulo, já a partir do primeiro trimestre de 2025, com a abertura do Tivoli Kopke, em Vila Nova de Gaia, um hotel de 5 estrelas, com 154 quartos, com acesso exclusivo a uma cave centenária da Kopke, oito mil metros quadrados de jardim, e com restaurantes que também irão espelhar a qualidade gastronómica nacional.
Nos hotéis Vila Galé, devido à notoriedade da marca, o turista nacional lidera, reconhecendo Pedro Ribeiro que mercados como os da América do Norte e da América do Sul, “têm uma audiência muito grande nos hotéis ligados ao Enoturismo”.
Já na Torre de Palma, o americano reina, com o brasileiro e o canadiano a merecer, igualmente, referência. Contudo, Luís Rebelo assinala que “não podemos cair no erro de nos focar só num mercado. Vimos isso com a pandemia ou com as guerras. O turismo é um setor supersensível a crises sociais e económicas”, justificando, assim, “uma aposta na diversidade, até porque diferentes mercados procuram experiências distintas”.
De fora ficaram, por agora, os mercados asiáticos, embora Maria Manuel Ramos destaque a procura que tem existido por clientes coreanos, fruto, eventualmente, do voo direto entre a Coreia e Portugal.
Luís Rebelo admite que os mercados asiáticos “já têm interesse em Portugal, mas vão a Lisboa e ao Porto”, assinalando, contudo, tratar-se de um mercado com muito potencial, mas que vai demorar uns anos até chegar ao Alentejo”.
Nos Vila Galé, Pedro Ribeiro admite que o mercado asiático “começa a ter o seu espaço, mas não com foco no Enoturismo, mas para visitar as cidades ou regiões onde temos as nossas unidades e que acabam, por vezes, por se aperceberem que realmente estão em regiões de vinho e acabam por ter uma experiência e comprar vinho”.