“Portugal está na moda, mas o estar na moda dá muito trabalho”
Banco oficial da BTL desde 2016, o BPI volta a marcar presença no maior evento do turismo em Portugal. Para Pedro Barreto, administrador do banco, é “verdadeiramente surpreendente a resiliência do setor do turismo”, frisando que “é fundamental continuarmos a melhorar a qualidade, porque temos um potencial enorme”.
Victor Jorge
BTL
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Otimista quanto ao futuro do setor do turismo em Portugal, o administrador do BPI com o pelouro do turismo, Pedro Barreto, salienta que não se pode olhar para a retoma como uma “corrida de 100 metros”. Além do tempo que é preciso dar, o executivo do BPI destaca os desafios que o setor do turismo ainda terá de enfrentar, com os recursos humanos, desburocratização, formação e requalificação à cabeça.
De que forma é que um banco como o BPI olha para o setor do turismo e para as dificuldades e desafios que o setor enfrentou nestes dois anos? É inegável que temos um setor do turismo até março de 2020 e um setor do turismo pós março de 2020.
O setor do turismo é, a par da agricultura, um dos dois setores estratégicos para o BPI. Temos equipas dedicadas a este setor, temos uma oferta dedicada e uma série de eventos importantes. Portanto, é, claramente, um setor em que o banco quer estar, quer apoiar, e quer apoiar de forma crescente.
Como todos sabemos, foi o setor mais impactado pela pandemia e isso levou a quebras brutais quer do número de hóspedes, quer de receitas. É verdadeiramente surpreendente a resiliência do setor do turismo.
Confesso que, se me dissessem que o número de visitantes cairia 50% e que as receitas cairiam para menos de metade, iríamos ter uma série de problemas muito sérios.
Na minha opinião, é evidente que houve casos extramente difíceis e graves, mas a situação geral do setor ficou muito acima das minhas expectativas, pela positiva. O trabalho feito foi espetacular, de ajustamento, de melhoria da qualidade, de inovação e até de mudança de atitude acima de tudo.
Lembro-me de uma reunião que tivemos em que participou o Ferran Adrià [conhecido chef catalão, considerado um dos melhores e mais inovadores do mundo, ex-proprietário do restaurante El Bulli agora à frente do Bulli Lab] com uma série de clientes. Na altura, alguém perguntou, relativamente ao setor da restauração, o que é que pensava que, perante esta pandemia, deveríamos, em Portugal, mudar em termos de inovação. E a resposta dele foi muito interessante, salientando que somos muito bons a cozinhar. A questão, segundo Adriá, é de atitude. Dizia ele que, se em Portugal estavam habituados a fechar ao domingo, mas se têm clientes, têm de abrir ao domingo. Se não faziam take away, pois bem, têm de fazer take away. Foi esta adaptação, esta atitude de enfrentar os problemas que mais distinguiu o setor do turismo nestes últimos dois anos.
Foi, então, preciso uma pandemia para o setor, e não diria só do turismo, englobando a restauração, hotelaria, agências e operadores, acordar?
As crises fazem despertar essas mudanças, às vezes estruturais, e penso que o turismo fez isso muito bem.
Felizmente visito muitos clientes e tenho verificado que o aumento da qualidade da nossa oferta, nos últimos dois anos, é absolutamente notável. A melhoria dos procedimentos e dos processos. É fantástico.
Temos um grande desafio que são os recursos humanos. Mas eu acho que o balanço é francamente positivo e muito melhor do que as expectativas iniciais.
Um dos aspetos que mais se fala é, de facto, tentar perceber quando é que este setor volta ao que era, nomeadamente, ao ano de 2019, ano histórico no turismo em Portugal. Eu não vou perguntar quando é que essa retoma se vai dar, mas a minha pergunta é, teme que se possa perder alguma coisa do que se ganhou em termos desses processos, da qualidade, da inovação, ganhos com a pandemia.
Não. Estou muito otimista e tenho falado com vários hoteleiros e há expectativas quanto ao aumento das reservas já a partir de abril.
Acho que vai ser um ano, mesmo tendo um trimestre muito difícil, absolutamente fantástico. A própria Organização Mundial do Turismo (OMT) admite que se possa atingir, já em 2023, os números de 2019, quando anteriormente se apontava somente para 2024.
Sinceramente, acredito que vai ser mais rápido e que conseguimos uma coisa que é muito difícil de conseguir: aumentar a qualidade e termos mais turistas que estão mais tempo em Portugal. Isso é muito importante para captar quem tem capacidade para investir mais em Portugal.
É verdadeiramente surpreendente a resiliência do setor do turismo
Mas acredita que possamos atingir a tão falada meta do Plano “Reativar o Turismo | Construir o Futuro” de, em 2027, ultrapassar os 27 mil milhões de euros de receitas turísticas e 80 milhões de dormidas?
Estou e sou otimista. Nós portugueses temos qualidades fantásticas como a capacidade de falar línguas, a capacidade de sermos simpáticos, de receber bem, temos um clima absolutamente fantástico – neste momento até bom demais porque não chove e isto pode vir a ser um problema para a agricultura, mas para o turismo é muito bom.
Vamos ter investimentos também na oferta para a terceira idade e vamos, claramente, ser um destino que vai ganhar muitos visitantes por essa via.
Responder às necessidades com tempo
Mas voltando atrás e a um tempo não tão positivo e otimista, quais foram, de facto, as maiores necessidades que uma entidade bancária como o BPI sentiu por parte dos seus clientes?
Acima de tudo, e não se aplica só ao turismo, é preciso dar tempo. Mais do que dar dinheiro, é preciso dar tempo.
Naturalmente, houve uma questão muito importante para resolver e que se prendeu com a questão laboral. Foi muito importante. Agora, o trabalho a fazer está na parte fiscal. Mas lá está, temos de dar tempo. Os projetos que avançaram mesmo antes da pandemia, o que eles precisam é de tempo, porque o potencial está lá, a qualidade está lá, e, muitas vezes, o que não está lá ou não se dá é tempo.
Há que olhar para esta situação não como uma corrida de 100 metros, mas como uma maratona?
Claro. Não pode ser vista como uma corrida de 100 metros, senão muitos ficarão pelo caminho.
E além do fator tempo, é fundamental o fator da comunicação e aqui o trabalho do Turismo de Portugal melhorou imenso e tem feito um excelente trabalho nessa matéria. Portugal está na moda, mas o estar na moda dá muito trabalho. E não é uma coisa que aparece de um dia para o outro, não é uma questão de sorte. Resulta de muito trabalho e os vários stakeholders do setor do turismo têm feito um trabalho fantástico. E é isso que temos de continuar a fazer.
Mas o importante não é só estar na moda, é conseguir manter-se na moda.
Temos de continuar a fazer o que temos feito e melhorar permanente a qualidade.
É impressionante vermos o nível da oferta que temos hoje de restaurantes e de hotéis. E não falo de tudo o que apareceu de novo. É o que já cá estava. Tenho amigos estrangeiros que vêm cá e ficam boquiabertos, porque achavam que iam encontrar um país muito menos desenvolvido, com uma oferta muito menos rica e ficam verdadeiramente encantados.
Exposição excessiva ao turismo?
Relativamente ao banco, o BPI aumentou a exposição às empresas de alojamento e restauração para o nível mais alto. Esta realidade vivida em 2020 e 2021 foi muito diferente em relação ao ano de 2020?
O que fizemos foi manter essa lógica de apoio ao setor, não só pelo lado da oferta, mas muito pelo lado da procura.
Houve vários empresários que estavam a pensar avançar com novos hotéis e que pararam. Pararam para pensar de forma prudente. Agora voltamos a verificar que esses projetos estão novamente a avançar e o banco está totalmente disponível para voltar a apoiá-los como já fazia anteriormente.
Mas o Banco de Portugal colocou a banca como um dos setores com maior probabilidade de incumprimento do crédito. Essa análise, na sua ótica, mantém-se ou é algo que não deve ser visto por esse prisma?
Não. Há um fator que influenciou o Banco de Portugal que foi o tema das moratórias, pois os bancos tiveram um volume muito elevado de moratórias. A verdade é que, por grande mérito das empresas, as moratórias acabaram e não se sente o problema.
Por isso, como em todas as crises, quando temos uma percentagem muito elevada de clientes que pedem moratória, vemos que essas pessoas vão voltar a pagar. Mais uma vez, reforço, precisamos, ou melhor, precisam de tempo e no caso do setor do turismo isso é claro.
Como disse, estou muito otimista já em relação a 2022 e, concluindo, penso que se trata de um setor onde não vamos ter muitos problemas.
Portanto, não teme o desaparecimento de muitos players do setor do turismo?
Sinceramente, acho que isso não vai acontecer. Os problemas que existem, já existiam antes da pandemia. Não são ou foram provocados pela pandemia.
Dou-lhe o exemplo da restauração onde, mal a crise apareceu, houve logo uma série de restaurantes que fecharam, mas outros, empresas familiares, que demonstraram uma grande flexibilidade. Houve logo esse ajustamento da oferta.
Acima de tudo, e não se aplica só ao turismo, é preciso dar tempo. Mais do que dar dinheiro, é preciso dar tempo
Esse ajustamento era necessário?
Sim, esse ajustamento era necessário, mas não tenho dúvidas que, o que sai desse ajustamento, são empresas mais fortes, de maior qualidade e mais focadas. É fundamental continuarmos a melhorar a qualidade, porque temos um potencial enorme.
Temos um potencial enorme de captar o segmento mais alto do turismo e acho que o estamos a fazer e bem.
O desafio da qualidade
É aí que Portugal deve apostar as “fichas”, nesse segmento mais alto, de qualidade?
Não deve, tem de apostar. E tem de fazê-lo não só externamente como internamente.
Até porque há muitos portugueses que desconhecem ou desconheciam o seu próprio país.
Nas minhas funções, estive durante sete anos à frente da rede balcões, tenho há quatro a banca de empresas, e andava sempre a viajar e garanto-lhe que temos um país fantástico.
Claro que esses destinos têm ainda um longo caminho a percorrer e estão a fazê-lo muito bem. Mas reconheço que ainda estamos no início.
No final do ano passado a diretora da Organização Mundial do Turismo (OMT) para a Europa, Alessandra Priante, dizia que a vantagem de Portugal, neste momento, era ser ainda um destino desconhecido e, por isso, a procura pelo país Portugal, pelo destino Portugal, só tenha um caminho: crescer.
Não tenho dúvidas nenhumas. E isso vai continuar a acontecer. Diria que temos um desafio no número de visitantes, mas temos um desafio e um potencial ainda maior na receita.
O que poderá acontecer é que para o português, Portugal está a ficar mais caro, mas para os turistas estrangeiros, para a qualidade que oferecemos, a relação preço/qualidade é ímpar.
Acredita que isso fará com que o setor do turismo volte a esquecer um bocadinho o turismo interno?
Não, porque há muitos portugueses que não conheciam bem o seu país e a pandemia permitiu conhecerem coisas fantásticas que existem em Portugal.
Mas temos o problema do arranque das viagens de longo curso e das viagens de negócios?
As viagens de um dia para fazer negócios poderão sofrer um pouco, sem dúvida. Mas recordo aquando do ataque às Torres Gémeas que se dizia que as pessoas não iriam viajar mais de avião.
Claro que as empresas não vão deixar os custos voltar ao que eram, já que apareceram alternativas que funcionam. O digital trouxe um ajustamento na forma de olhar para essas viagens de negócios. Lá está novamente o ajustamento.
Posicionamento pró-ativo
Regressando ao BPI, qual foi a solução ou produto mais procurado pelo setor do turismo durante este período de pandemia?
De facto, houve uma inflexão. Houve uma maior procura, e não só pelo setor do turismo, pelas linhas de apoio à economia e que permitiram a clientes e empresas ter créditos mais longos (mais uma vez, o tema de dar tempo) a taxas mais baratas e com um período importante de carência.
Os bancos têm um grande desafio de serem relevantes para os clientes, têm de trazer valor acrescentado. Passou a existir uma especialização e uma segmentação clara da oferta que não havia, de forma tão acentuada, há uns anos. Por isso, lançámos uma equipa dedicada só aos setores da agricultura e turismo e também para a parte do imobiliário.
Os clientes têm o seu dia-a-dia que não permite conhecer todas as linhas de apoio e todos os serviços. Daí termos essas equipas dedicadas para ajudá-los a organizar melhor os seus investimentos.
Dou-lhe o exemplo da agricultura onde o banco apostou a sério há mais de 10 anos. Não era um setor evidente. Agora toda a gente diz que é evidente.
Decidimos investir no turismo ainda antes da pandemia. Com base naquilo que vejo hoje, acho que foram duas decisões absolutamente acertadas.
Atualmente, temos quotas de 20% no setor da agricultura e queremos isso para o turismo.
Isso faz-se com mais produtos, mais soluções, mais serviço, mas também com uma simplificação de oferta. Não é por termos mais produtos, mais serviços que somos relevantes. É por termos uma oferta ajustada ao que o setor precisa e apresentá-la de forma simples.
Não é por termos mais produtos, mais serviços que somos relevantes. É por termos uma oferta ajustada ao que o setor precisa e apresentá-la de forma simples
E, de certa forma, desburocratizar os processos?
Sem dúvida. Explicar porque é que, quando o Governo lançou as linhas de apoio à economia, o dinheiro não chegava à economia. Não chegava precisamente, porque o processo era muito complexo.
Foram tomadas decisões importantes pelo Governo para simplificar os processos, mas ainda assim, em Portugal exige-se papéis a mais. No caso das linhas para a economia era preciso entregar 17 documentos para uma empresa candidatar-se a uma linha de emergência.
Que, como o nome indica, é de emergência?
Exato. Mantivemos contactos com as autoridades para agilizar processos e mesmo internamente o BP foi proativo e não ficou à espera.
Falou no Governo, Governo esse que toma posse no próximo dia 23 de fevereiro. Se tivesse que indicar algumas medidas a tomar rapidamente para ajudar o setor do turismo, quais seriam?
Desburocratização é absolutamente fundamental. Além disso, formação e requalificação. Também aqui, os cursos existentes são excessivamente longos.
Uma pessoa que queira mudar de vida e queira aprender a trabalhar na área do turismo, demora muito tempo a conseguir essa requalificação.
Essa questão dos recursos humanos é um dos problemas colocados pela pandemia. Como é que olha para essa renovação e/ou requalificação dos quadros?
Vejo-o como um grande desafio. Não existem cursos pensados para o curto prazo.
Temos pessoas muito bem formadas, mas depois a oferta continua a ter salários muito baixos e rapidamente se começa a pensar em ir lá para fora. Há que pensar na questão fiscal.
Viagens sustentáveis
Inovação e sustentabilidade são outros dos temas.
Sim, mas na questão da sustentabilidade até estamos bem. As pessoas, cada vez mais, procuram experiências, turismo inovador e autêntico. No BPI tenho, também, a responsabilidade da sustentabilidade. Acabámos de concluir o nosso Plano Diretor de Sustentabilidade, feito em cooperação, obviamente, com o CaixaBank, e que inclui já uma série de ideias de ajustamentos dos nossos serviços e da nossa oferta. Na nossa comunicação temos perto 120 ideias nesse sentido e, a questão da sustentabilidade vai transformar o mundo.
É uma pena que a Europa esteja sozinha na vanguarda deste tema. Estamos mais avançados que os EUA, por exemplo, e é muito importante que outros países e continentes invistam nesta questão que é um movimento incontornável e imparável.
Há, por exemplo, objetivos muito claros que estão definidos, quais são as metas a atingir pelos bancos.
Desburocratização é absolutamente fundamental
No BPI analisa-se os projetos também por esse prisma da sustentabilidade?
Claramente. Também aqui vamos ser pró-ativos e, mais uma vez, iremos falar com os nossos clientes no setor do turismo para fazer investimentos no sentido da sustentabilidade quer seja no aproveitamento das águas, na parte energética, minimizar o desperdício.
Diria que é um grande desafio, mas uma grande oportunidade e o banco que está, precisamente, a estruturar muito bem a informação e a preparar-nos para cada um dos principais setores.
As pessoas irão viajar em função da sustentabilidade do destino?
Sem dúvida, principalmente nas camadas mais jovens. Nós temos condições absolutamente excecionais para sermos um dos países que mais vai beneficiar com esta alteração de mentalidade.
O patrocínio do BPI à BTL não é de hoje, vem de 2016. Que tipo de patrocínio é esse e que benefício é que o BPI, de facto, retira do patrocínio à BTL. Como é que o BPI de facto se posiciona naquela que é a maior evento do setor do turismo em Portugal?
Tal como referi, há anos que decidimos apostar em dois setores estratégicos: agricultura e turismo. Na agricultura, estamos na Feira Nacional da Agricultura e na Ovibeja. No turismo, estamos na BTL e é um apoio para manter.
É um local que nos permite estar com os clientes do banco, falar com eles. Não é só ouvir, mas é também aconselhar. Lá está a proatividade. Os bancos têm que ser proativos e as equipas comerciais não podem estar à espera que os clientes entrem pela porta do banco.
Para o BPI o que seria uma BTL de sucesso?
Seria uma BTL com o número de participantes, pelo menos igual, a 2019, com a qualidade que eu tenho visto, com uma oferta muito bem organizada e com os expositores de elevada qualidade. Essa imagem de qualidade é fundamental, do país, dos destinos, das pessoas.