Viagem ao mundo da operação turística| Parte III
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O Publituris publica a terceira e última parte do artigo “Viagem ao mundo da operação turística”, publicado na edição impressa do jornal de 24 de Novembro. O trabalho resulta do encontro entre quatro operadores turísticos portugueses e o director de vendas da TAP para Portugal, Paulo Henrique Salles Cunha, para discutir o estado do sector no País. Falou-se de concorrência e transparência entre operador e o canal de distribuição e da relação comercial com a companhia aérea de bandeira.
Relação comercial com a TAP
O debate passa a ser centrado na relação comercial dos operadores turísticos com a TAP, e o director de vendas da companhia é o primeiro a intervir para responder à questão de qual é a importância da distribuição para a TAP. ”Sempre foi e continuará a ser alta”, começa por dizer. Apesar de ser um mercado novo, – o responsável assumiu o cargo este ano, depois de ter trabalhado vários anos no Brasil e em Espanha-, Paulo Henrique Salles Cunha está surpreendido com “o nível de profissionalismo” dos operadores em Portugal, que afirma ser “muito elevado”. “Na pergunta anterior ia dar uma resposta externa e isenta em relação ao suposto corporativismo. Impressiona-me a forma como os operadores aqui se defendem, no bom sentido da palavra. Ou seja, penso que é uma questão de defesa e não de proibição ou evitar que outros concorrentes entrem”.
Voltando à importância que a companhia dá a este canal e se as directrizes da administração são para continuar a apostar na distribuição, o responsável afirma que sim, “não só no canal de operação, mas no canal indirecto”. “Nos últimos anos, assistimos a uma mudança radical naquilo que são as formas de fazer negócio. As companhias aéreas passaram a ser vistas, eventualmente, como um inimigo. E uma das coisas que estou a tentar trazer para o mercado é o oposto. Temos a consciência que, mesmo com as mudanças na forma de fazer negócio e na tecnologia, que permite às companhias chegar a um maior número de clientes, o nosso intuito nunca foi, nem nunca vai ser, abraçar o mercado inteiro, por uma razão muito simples: é impossível”.
O responsável afirma que “cada vez mais as companhias aéreas têm capacidade de chegar a um público directo”. “Aquilo que disse antes, relativamente aos operadores é válido para mim. Defendi e continuo a defender que, se quiser fazer um negócio directo com o cliente, não o posso fazer pela via de condições diferenciadas, só o posso fazer pela via da decisão do próprio cliente. Algo que posso afirmar com alguma segurança é que a direcção de vendas Portugal tem autonomia para decidir como é que esta relação com o mercado vai ser daqui para a frente”, garante.
Mas estarão os operadores turísticos demasiado dependentes da TAP? Para Nuno Mateus, a resposta é simples: “Sendo a companhia de bandeira, é inevitável que a TAP seja a nossa companhia número um, porque é a companhia com mais voos à partida de Portugal. A TAP é provavelmente a empresa mais importante de Portugal. Como todas as empresas, há momentos em que temos discussões com a TAP, porque temos pontos de vista às vezes diferentes. É sem dúvida nenhuma o nosso principal parceiro”.
José Manuel Antunes reforça a ideia que a TAP é a empresa “mais importante de Turismo em Portugal e se calhar do País”. No entanto, alerta para o facto de existirem alguns operadores cuja relação comercial não passa necessariamente pela TAP. “Penso que a companhia está atenta a isso nos últimos dois anos e nós temos vindo a fazer operações charter com a TAP já em grande número. “Para o Réveillon na Madeira, apesar da companhia ter voos regulares e extra para o destino, temos com a TAP oito charters, exactamente no período de Fim-de-Ano. Portanto, a TAP deu-nos preços razoáveis para competirmos com a própria TAP, porque a companhia entendeu, e bem, que existe essa complementaridade. O melhor exemplo que podemos dar é a nossa operação de Verão para Porto Santo, em que a TAP tem o monopólio para Porto Santo e tem o charter connosco também. Fazemos 34 charters para Porto Santo com a TAP e, em 2018, vamos repetir”, garante.
Paulo Henrique Salles Cunha dá outro exemplo: a operação para Boavista, em Cabo Verde. “A operação hoje existe em função dos operadores, que tiveram a capacidade de propôr e assumir o risco de sustentar essa operação com a TAP e é um caso de sucesso”.
Mas se em alguns destinos as relações estão boas, outros há em que nem sempre é assim. “Em alguns destinos, a TAP não tem a abertura que pensamos que poderia ter em relação aos operadores. O exemplo mais claro é o Brasil, onde o número de lugares que dá aos operadores é manifestamente insuficiente. Até pelo histórico, quando em 2009, se decidiu alterar o esquema, é bom lembrar que os operadores em conjunto tinham 11 charters semanais para o Brasil e abdicaram deles para apoiar a TAP e, aos poucos e poucos, a TAP foi retirando espaço aos operadores. Hoje em dia, a operação para o Brasil é muito reduzida”, lembra José Manuel Antunes.
Apesar de darem preferência à TAP, na Solférias, “quando a companhia nos fecha a porta, vamos à procura de alternativas. O que está a acontecer é que há cada vez mais companhias aéreas interessadas no Brasil e há mais rotas para o destino”, diz Nuno Mateus.
A ideia é complementada por Miguel Ferreira. “Não só o Brasil, os EUA, em que a TAP era dona e senhora do destino, com voos do Porto e Lisboa para Nova Iorque e depois Miami, e de repente temos as companhias norte-americanas a voar para cá”. Em relação à dependência, o operador considera que é de 50-50. “O Paulo Henrique deu um exemplo da Boavista, se não fossem dois operadores, aquele voo morria. Há rotas em que a TAP já não precisará dos operadores, como é o caso Brasil, mas quando o balão de oxigénio se esvaziar, se calhar vai voltar a precisar”. A solução, na opinião do responsável da Exoticoonline, é encontrar “um ponto de equilíbrio entre os destinos”, porque quando a companhia abre novos destinos e pede ajuda aos operadores, em geral, os operadores estão com a TAP. Nos destinos que estão com ocupações elevadíssimas esquecem-se que os operadores também ajudaram a abrir e a sustentar esses destinos”.
Perante o que atrás foi dito, o director de vendas da TAP para Portugal assume que “um dos grandes desafios é aproximar o máximo que puder todos os players envolvidos”. “Quando um operador decide fazer uma acção, é o responsável do operador que decide, quando é uma companhia aérea há muitos factores em torno de uma decisão que têm de ser considerados. (…) Tenho do lado de lá aquilo que chamamos de Rede (departamento que faz a gestão da ocupação e do preço), que não é um ser vivo monstruoso. Nas três pontas, a visão que cada um tem das outras duas é a pior possível. A rede olhava para o departamento de vendas como o departamento na TAP onde tudo podia ser feito. Os operadores olham para a Rede como um monstro que não deixa nada acontecer e nós olhamos para os operadores como aqueles que só querem os preços baixos e nenhum dos três tem razão, só que esse paradigma tem de ser desmontado”, defende.
Fernando Bandrés corrobora a opinião dos restantes operadores: “A TAP é um parceiro muito importante, mas é óbvio que, quanto mais relações comerciais temos, mais momentos de desencontro vamos ter, porque muitas vezes os nossos interesses não coincidem. A isso acrescento uma nova realidade da TAP, à qual a própria companhia se está a adaptar”. O mais importante, refere o director de operações da Soltrópico, é “a vontade de dialogar e chegar a bom porto nas negociações”, algo que tem acontecido. “Nesse sentido, e agora falo do mercado espanhol, nunca tinha visto uma proximidade tão grande de uma companhia de bandeira com o sector da operação turística”.
Como melhorar a relação comercial com a TAP?
A opinião é unânime: mais do que melhorar a relação comercial com a TAP, há em primeiro lugar um aspecto que está a limitar, tanto trabalho da TAP, como o dos operadores, que se chama aeroporto de Lisboa. “Neste momento, estamos a debater-nos com uma dificuldade tremenda do aeroporto de Lisboa, começa por dizer Nuno Mateus. “Temos praticamente todas as operações pedidas para o próximo Verão, nunca tínhamos pedido com tanta antecedência e, mesmo assim, estamos expectantes se confirmam ou não”, afirma o responsável da Solférias. “Para todos podermos aumentar o negócio, e a TAP também, há uma estrutura que nos está a faltar e isso inevitavelmente vai prejudicar o sector e o País. Neste momento há muitas limitações às quais nem nós, nem a TAP consegue responder. Se me perguntarem neste momento o que é mais importante, é o aumento do aeroporto de Lisboa”, defende.
Por ser uma aposta dos operadores ou por força deste estrangulamento em Lisboa, a verdade é que nunca houve tanta operação do Porto como este ano, confirmam os operadores.
Quanto ao que pode ser feito para melhorar as relações comerciais com a TAP, Nuno Mateus começa por fazer um balanço do Verão, revelando que, com a companhia aérea não existiram praticamente problemas. “Esta operação de 2017 foi a que teve mais operações charters com a TAP e houve um caso pontual em dezenas de charters. O Verão correu bem”. A maior crítica que o responsável faz à TAP tem a ver com o tempo de resposta. “Qualquer decisão ou qualquer resposta que o Paulo dê como director de vendas da TAP, tem vários pareceres que têm de ser respeitados porque a máquina é muito grande. Enquanto nós, como empresas mais pequenas, apesar de também termos de pedir autorizações, é muito mais fácil, do que no caso de uma companhia aérea. Esse atraso na resposta é que às vezes nos dificulta a vida”.
Para Paulo Henrique Salles Cunha, “esta é uma relação em que sempre vai haver atritos, mas não são atritos maus. Tenho experiência em três mercados no Brasil, este é o primeiro mercado em que o diálogo é tão profícuo”. O que é que pode melhorar? “Na relação comercial não vejo grandes pontos de melhoria, nós dialogamos bem, mesmo quando temos de discutir, discutimos. Mas conceptualmente o que pode melhorar é a percepção do mercado que a operação tem um valor, uma responsabilidade por detrás do que está a ser oferecido que tem de ser reconhecido”, refere o responsável da companhia.
Miguel Ferreira também afirma que dificilmente operadores e companhia aérea estarão sempre de acordo e relembra que “passámos a ter outra TAP, houve uma transformação da companhia, nós somos animais de hábitos e por natureza avessos à mudança. Quando estamos na nossa zona de conforto, não queremos sair. Quando nos impõem mudanças muito bruscas, é legítimo que exista algum confronto, mas dizemos o que pensamos, expomos os problemas e tentamos chegar a um equilíbrio”, constata.
O diálogo é a premissa usada por todos e Nuno Mateus até dá o exemplo: “Estivemos na WTM, em Londres, e houve muitas reuniões com fornecedores que fizemos em conjunto com outros operadores, porque temos várias parcerias. A verdade é que discutimos abertamente os problemas com os fornecedores, o que eles nos dizem é que não conhecem nenhum mercado onde dois operadores vão discutir questões que são pertinentes para o destino. Nos últimos dois, três anos houve uma grande evolução ao nível da partilha de operações, até porque o nosso mercado é pequeno”, conclui.
Nova directiva
É talvez a questão que mais se fala hoje em dia no sector distribuição, mas há muito tempo que os operadores olham para a Nova Directiva das Viagens Organizadas. “Andamos a falar da Nova Directiva há algum tempo e é algo que nos preocupa bastante. O que está em causa, no fundo, é o aumento da nossa responsabilidade e isso é inevitável”, afirma Nuno Mateus. O responsável da Solférias e também do Capítulo dos Operadores da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT) destaca “a forma exemplar” como os operadores turísticos encontram soluções para se defenderem em relação a futuros problemas. “A lei, se for promulgada, entrará em vigor no dia 1 de Junho de 2018. Quatro operadores [Exoticoonline, Sólferias, Soltrópico e Sonhando] aderiram ao Seguro por Motivos de Força Maior em Dezembro de 2016. Até aí nos destacamos de outros mercados”, refere o responsável. Nuno Mateus recorda ainda que, antes desta decisão de aderir a este seguro, os operadores depararam-se com a greve de segurança nos aeroportos portugueses em Agosto de 2016, que teve um impacto de meio milhão de euros. “Nós reembolsámos os clientes e não tínhamos que o fazer. Fizemo-lo na expectativa que o mercado entendesse que existe uma diferença em reservar connosco ou directamente num site em qualquer parte do mundo”, defende.
Ainda em relação à nova directiva, Nuno Mateus afirma que estão preparados para a sua transposição, mas alerta para a necessidade de todos os ‘players’ do mercado estarem atentos. “Muitas vezes quando lançamos os programas, as pessoas só comparam o preço, e não comparam que há operadores que gastam uma fortuna em ter cláusulas que defendam os passageiros de todos os imprevistos”. O director-geral da Solférias volta ao início da conversa: “A lei permite que todos façam a sua programação. Sabemos que por muito que passemos a mensagem de que a lei vai entrar em vigor no próximo ano, vai haver sempre pessoas distraídas que não se aperceberam disto. A verdade é que não sou obrigado a ter um seguro, mas sou obrigado a reembolsar o cliente. Se tiver capacidade financeira, posso fazê-lo, acho que nenhum de nós a tem”.
Miguel Ferreira destaca que, pela primeira vez, a lei é transversal a todos os países da União Europeia. “O que se passou com a última lei comunitária é que, enquanto Espanha não a transcreveu na totalidade, Portugal quis ser um dos primeiros países a transcrever e fez um ‘copy’ e ‘paste’ da lei”. “Desta vez parece que não, há uma transcrição para todos e isso significa que nos põe em pé de igualdade com outros mercados.” O responsável da Exoticoonline acrescenta ainda que “há dois anos que têm havido reuniões no Capítulo de Operadores na APAVT para acautelar esta questão, ao ponto de nós os quatro estarmos preparados caso a lei entre em vigor amanhã”.
José Manuel Antunes comenta: “Se isto é corporativismo, é um corporativismo positivo. Temos uma tradição em Portugal, desde a década de 90, de fazermos ‘pools’ de operadores. Quero enaltecer o Capítulo de Operadores da APAVT que sempre existiu, mas era completamente amorfo. Desde que está cá o Nuno Mateus, que as coisas mudaram. Temos um grupo solidário, activo, que dá também confiança aos pequenos operadores”. ¶
*Agradecimentos ao Hotel Iberostar Lisboa