Foto: Nuno Martinho
O que foi 2023 e o que será 2024 – Ana Jacinto (AHRESP)
Para a secretária-geral da AHRESP, Ana Jacinto, “o alívio da carga fiscal e contributiva sobre o rendimento do trabalho e das empresas; apoios e incentivos ao investimento na formação e qualificação das profissões de turismo; e disponibilização de forma mais clara e de simples acesso a mecanismos de financiamento” estão entre os principais pedidos a um futuro Governo saído das eleições de 10 de março.
Victor Jorge
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Findo o exercício de 2023, que balanço faz deste ano?
O ano que está agora a acabar foi sem dúvida de superação no que à evolução da atividade turística nacional diz respeito.
Os principais indicadores, tanto no que concerne à evolução do número de hóspedes e de dormidas, como à evolução das receitas turísticas internacionais e dos proveitos nos estabelecimentos de alojamento turístico excederam qualquer expectativa.
Provas evidentes desta superação são as estatísticas do Instituto Nacional de Estatística, que, de janeiro a outubro de 2023, registam mais de 26,3 milhões de hóspedes, 14% acima do período homólogo de 2022., e mais de 68,5 milhões de dormidas (+11% face a 2022).
Em matéria de estatística também devo realçar os proveitos globais (5,4 mil milhões de euros até outubro) e de aposento (4,2 mil milhões de euros) que a dois meses do final do ano ultrapassaram o valor anual de 2022.
Só que, apesar destes dados bastante positivos, reflexo da resiliência dos setores que tanto têm contribuído para o crescimento da economia nacional, também tenho de salientar que existem ainda muitos empresários da restauração e similares e do alojamento turístico, sobretudo de micro dimensão, a enfrentar dificuldades para levar os negócios a bom porto. Não nos podemos esquecer que muitas das tesourarias enfraquecidas no contexto da pandemia ainda não conseguiram aumentar a rentabilidade.
E um dos principais motivos destas dificuldades é a diferença abismal entre a inflação global (1,5% em novembro) e a alimentar, com muitas das principais matérias-primas a manterem preços elevados e uma inflação entre os 7% e os 9%. À inflação e aos elevados custos de produção acrescento a elevada carga fiscal que se continua a verificar sobre o rendimento do trabalho, assim como outros custos das empresas com empréstimos contraídos nos últimos anos.
O meu balanço de 2023 assenta num duplo sentimento: de muito orgulho, ao constatar, mais uma vez, que o Turismo continua a ser motor principal da nossa economia, mas também de grande preocupação e prudência quanto ao futuro de muitos negócios no setor da restauração e similares e do alojamento turístico.
Na sua perspetiva, o que faltou concretizar no setor do turismo neste ano de 2023?
Diria que o que faltou concretizar foi a implementação de ações que, direta ou indiretamente, minimizassem as grandes dificuldades sentidas pelas empresas. Refiro-me a ações de apoio à gestão financeira e ao planeamento de investimentos internos, bem como à contratação de recursos humanos e manutenção dos postos de trabalho.
Teria sido fundamental se no decurso de 2023 tivessem sido implementadas as medidas que a AHRESP há muito tem vindo a propor, como a aplicação temporária, pelo período de um ano, da taxa reduzida do IVA a todos os serviços de alimentação e bebidas; a reposição integral da taxa intermédia do IVA nos serviços de alimentação e bebidas; a redução da carga contributiva sobre rendimentos de trabalho; ou a disponibilização de mecanismos financeiros com vista à redução do endividamento das empresas e que promovessem a reposição dos capitais próprios, de acesso simples e ajustados à realidade das microempresas.
Como antevê o ano de 2024 em termos económicos?
Falar de expectativas para 2024 exige-nos prudência, dada a incerteza não só económica, mas também social e política, que marcam o atual momento. Prudência esta que ganha maior relevância quando o próprio Banco de Portugal recentemente reviu ligeiramente em baixa a previsão do crescimento económico para 2024, na ordem de 1,2%. A desaceleração da inflação global ainda não se reflete no poder de compra das famílias, que se mantém drasticamente reduzido, o que também tem provocado impactos negativos, particularmente no setor da restauração.
E que desafios terá o setor do turismo em 2024?
Os desafios são diversos e, obviamente, divergem entre regiões, entre setores de atividade (restauração e alojamento turístico) e entre perfis e dimensão das empresas. Contudo, para a generalidade das empresas da atividade turística, os desafios continuarão a estar relacionados com dificuldade na contratação de colaboradores qualificados; dificuldades na retenção de talentos; elevada carga fiscal e contributiva sobre o rendimento dos trabalhadores; e com o desequilíbrio entre a inflação alimentar e a global.
As nossas empresas terão também de gerir as consequências da situação política do país que nos conduziu a um governo de gestão e eleições antecipadas, cujo resultado também poderá ter impacto no Orçamento do Estado aprovado e por consequência impacto no tecido.
Mas pensar sobre como vai ser 2024 também me obriga a falar de sustentabilidade. Um dos grandes desafios do turismo será assegurar não só receitas como também uma mudança de mentalidades. Todas as empresas precisam de se tornar mais sustentáveis, seja por razões regulatórias, para atender às preferências dos clientes ou para alavancar ganhos financeiros. O desconhecimento generalizado sobre as práticas de sustentabilidade e os custos associados à transformação são desafios enormes que as nossas empresas enfrentam. É por isso que a aposta na literacia em sustentabilidade será essencial.
Por outro lado, e como já referi, o desafio da qualificação também será vital no combate ao já velho problema da falta de pessoas qualificadas. Penso que as empresas do Turismo devem, cada vez mais, apostar na qualificação dos seus trabalhadores e na retenção os seus talentos.
O que gostaria de ver concretizado em 2024? E a fazer um pedido ao Governo que sairá das eleições de 10 de março de 2024, qual seria?
Os desejos ou pedidos que a AHRESP poderá concretizar estão naturalmente relacionados com a execução de medidas e estratégias que permitam, por um lado, atenuar os efeitos dos diversos constrangimentos ao crescimento dos negócios da restauração e do alojamento turístico, e, por outro, promover uma maior competitividade empresarial.
Desde logo, a reversão das novas medidas legislativas para o Alojamento Local resultantes do Pacote Mais Habitação. Seria fundamental estudar, avaliar e conhecer a realidade do Alojamento Local para depois serem tomadas as medidas consideradas, eventualmente, necessárias e adequadas.
Como crucial e já sublinhado, também o alívio da carga fiscal e contributiva sobre o rendimento do trabalho e das empresas, em particular nas de micro e pequenas dimensão; apoios e incentivos ao investimento na formação e qualificação das profissões de turismo; e disponibilização de forma mais clara e de simples acesso a mecanismos de financiamento.
Gostaríamos que fossem criadas e promovidas condições para que as empresas do turismo consigam beneficiar na íntegra desta evolução extraordinária da atividade turística, que passaria pelo reforço das suas tesourarias por via do aumento das receitas geradas. A tendência será para termos mais turistas, de mercados internacionais mais diversificados, com diferentes necessidades de consumo, para os quais será necessário ter uma oferta cada vez mais estruturada e com trabalhadores qualificados e capazes de responder e superar as expectativas. Acima de tudo, gostaríamos de ter empresas com tesourarias bastante mais robustas, capazes de suportar as necessidades de investimento, e de gerar uma maior competitividade empresarial.