“O Enoturismo agradece que se trabalhe o setor de uma forma bem mais incisiva e eficaz”
Nascida em fevereiro de 2020 com o objetivo de colocar no mapa o Enoturismo português, a Associação Portuguesa de Enoturismo (APENO) tem-se preocupado em pensar o Enoturismo em Portugal e também apresentar soluções. Maria João Almeida, presidente da associação, acredita que, “se a responsabilidade do Enoturismo estivesse dividida entre as entidades responsáveis do Turismo, mas também do Vinho, cada um com funções muito específicas, chegaríamos mais longe”.
Victor Jorge
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Combinando a atividade do turismo e a cultura do vinho, o enoturismo está identificado como um dos segmentos com maior potencial de desenvolvimento do turismo em Portugal e a nível internacional. Maria João Almeida, presidente da APENO, salienta que, em Portugal, “não existe uma definição oficial de Enoturismo, nem uma legislação básica que permita às empresas guiar-se na oferta de um serviço de qualidade”.
No entanto, destaca que, em Portugal, “quem trabalha bem o Enoturismo não fica atrás de nenhum outro no mundo”. Falta, contudo, “ações de promoção mais incisivas e direcionadas”.
O Enoturismo foi identificado como um dos segmentos de maior relevo para o crescimento e promoção de Portugal a nível do Turismo. Como caracterizaria o atual estado do Enoturismo em Portugal? Temos, efetivamente, um mercado de Enoturismo, em Portugal, ou existem, simplesmente, casos isolados de agentes que possuem e exploram o Enoturismo?
Vivemos num país curioso … O Turismo de Portugal definiu o Enoturismo como um dos segmentos de maior relevo para o crescimento e promoção de Portugal a nível do Turismo, mas não tem uma base de trabalho organizada. Senão veja: ainda ninguém tem definições legais nem números que ajudem a compreender o setor do Enoturismo. Não existe uma definição oficial de Enoturismo, nem uma legislação básica que permita às empresas guiar-se na oferta de um serviço de qualidade. Cada um faz à sua maneira.
Não existe, também uma CAE ou sub-CAE que permita a quantificação do setor, um CIRS – código IRS que permita o registo dos profissionais liberais, nem uma definição de categorias profissionais para quem trabalha no setor. Estas, entre tantas outras questões, têm de ser necessariamente debatidas.
Desde que nasceu, há mais de três anos, a APENO tem tentado alertar o Governo para resolver esta questões e em criar bases sólidas de trabalho para que Portugal seja considerado uma região de referência no Enoturismo a nível mundial.
Devo dizer que já apresentámos a nossa associação e estas questões a várias entidades oficiais, entre as quais o secretário dos Assuntos Fiscais (na altura ainda António Mendes, hoje adjunto do Ministro), o secretário de Estado de Agricultura, o Presidente da República, o presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, vários presidentes de Comissões Vitivinícolas e Entidades Regionais de Turismo, e até à Confederação do Turismo de Portugal, que desde logo perceberam a lógica e a urgência desta situação.
Qualquer dia o Turismo de Portugal estará sozinho a dizer que esta questão não é relevante. Na última reunião que tivemos com o secretario de Estado do Turismo, Comércio e Serviços (SETCS), Nuno Fazenda, parece ter havido uma maior abertura para esta questão. Esperemos que ele consiga influenciar quem de direito a trabalhar mais eficazmente!
Soluções apresentadas pela APENO
Que soluções têm sido apresentadas pela APENO para resolver estas situações?
Mais do que os problemas, a APENO tem-se preocupado em pensar o Enoturismo e também apresentar soluções. Para começar, já temos uma definição oficial e atualizada de Enoturismo, que já inclui as atividades de Enoturismo Urbano, como por exemplo, provas comentadas em garrafeiras ou restaurantes. E passo a citar: “Enoturismo é uma agregação de atividades turísticas que se centra na experiência motivada pela apreciação dos vinhos, associada às tradições e cultura locais, seja em ambiente rural ou urbano”.
Também estamos a trabalhar, juntamente com um dos mais reconhecidos escritórios de advogados portugueses, a ABREU Advogados, na definição de uma legislação básica de Enoturismo para sugerir ao Governo.
Por último, ainda agora o INE está a fazer uma revisão de CAE, e a APENO, entre outras entidades, sugeriu a criação da sub-CAE para o Enoturismo. Para que o pedido tivesse mais efeito, pedimos ainda a intervenção do SETCS nesta matéria, no sentido de dialogar com o INE sobre esta possibilidade, visto que existem regras complicadas para a criação de uma sub-CAE para o Enoturismo, visto que é uma atividade económica que engloba diversas áreas. Se o secretário do Estado do Turismo não conseguir, não sei quem o poderá fazer!
Atrair turistas americanos não é a mesma coisa que atrair enoturistas americanos
Apesar de tudo, foram ou têm sido dados passos para que o Enoturismo em Portugal possua, efetivamente, um lugar de destaque como um dos segmentos a ter em conta na promoção de Portugal enquanto destino turístico?
Obviamente que sim. Todos sabemos que o nosso país tem um potencial incrível a todos os níveis. Beleza natural, património, riqueza cultural, uma hospitalidade incrível, excelente gastronomia e vinhos, que é o motor disto tudo! E em Portugal, quem trabalha bem o Enoturismo não fica atrás de nenhum outro no mundo. Temos a mania que só lá fora é que se faz bem, mas não, só quem viaja pelo mundo e compara enoturismos de vários países se consegue aperceber melhor desta situação.
E nas várias regiões nacionais existem projetos fantásticos, que servem de modelo a outros enoturismos para trabalharem cada vez melhor. Se a par da organização do setor resolvermos outros problemas que existem como a falta de mão de obra, de formação, e se estruturamos bem a nossa oferta, entre outras questões pertinentes estamos a contribuir para que o setor do Enoturismo dê ainda maiores passos.
O papel da APENO
A criação da APENO tem por objetivo dar consistência e importância ao Enoturismo enquanto produto turístico? Como e que ferramentas, soluções, atividades poderão e deverão ser criadas, lançadas e/ou dinamizadas pela APENO, de forma a ter um produto Enoturismo estruturado?
Sempre acreditei na união de forças para atingir um fim. E em formações objetivas e eficazes! Assim, a APENO promove desde o seu início, o “Encontro Nacional dos Profissionais de Enoturismo”, um evento que, tal como o próprio nome indica, reúne os profissionais da área do Enoturismo para se encontrarem, conversarem, trocarem experiências e aprenderem o que se está a fazer, como fazer e quais as tendências mundiais. Nestes encontros, onde são sempre convidadas personalidades que são referências nesta matéria, debatem-se sempre assuntos pertinentes, sendo a estruturação da oferta um dos temas mais importantes, promovem-se workshops e mesas redondas para ensinar e debater essa questão. A APENO fez recentemente, também, uma parceria com a Associação Portuguesa de Agências de Viagens e Turismo (APAVT) e espera organizar ainda mais atividades do género.
Esta falta de organização está do lado dos produtores de vinho, agentes do Enoturismo ou também existe uma inexistente coordenação por parte das entidades responsáveis pela promoção do Enoturismo a nível interno e externo?
Obviamente a culpa nunca é só de um lado. É como tudo, há empresas que trabalham bem e entidades que trabalham bem, dentro das suas possibilidades, mas depois também há empresas e entidades que trabalham mal.
A ideia é, pelo menos, conseguir um equilíbrio entre as partes para podermos alcançar objetivos e trabalhar cada vez melhor. No entanto, digo sempre que quem está no terreno é sem dúvida quem conhece melhor, tem uma profunda noção da realidade, e as entidades têm de saber ouvir e tentar agir na resolução dos problemas existentes.
Relativamente à promoção externa, o Turismo de Portugal tem atraído milhares de turistas para Portugal e isso prova que quando quer sabe trabalhar bem. Era bom que também estivesse ciente que o Enoturismo é uma atividade económica muito específica, e que é preciso saber trabalhá-lo. E como se vê não me parece que quer a nível interno ou externo esteja a trabalhá-lo muito bem.
As ações de promoção têm de ser cada vez mais incisivas e direcionadas ao Enoturismo e a turistas com cada vez maior poder de compra
De que forma é que o Enoturismo deveria estar, efetivamente, organizado, de modo a dar resposta às solicitações e exigências?
Como sabe, o pelouro do Enoturismo é gerido pelo Turismo. No entanto, na sua maioria, são as Comissões Vitivinícolas Regionais que mais o têm trabalhado de forma eficaz. Acredito que se a responsabilidade do Enoturismo estivesse dividida entre as entidades responsáveis do Turismo, mas também do Vinho, cada um com funções muito específicas, chegaríamos mais longe, isso seria a cereja no topo do bolo! Mas não sendo assim, a única forma é alertar para o que está mal e tentar corrigir, apostando cada vez mais na cooperação entre os dois mundos, para conseguimos ir mais longe.
Organização e promoção
Existem alguns exemplos internacionais que poderiam ser adaptados à realidade portuguesa?
Só recentemente é que o Enoturismo ganhou maior destaque a nível mundial e por isso ainda não existe nenhum país que se tenha organizado nesse sentido, daí a APENO ter estudado a fundo o nosso sistema fiscal e encontrado esta solução de criar a sub-CAE.
Cada país tem de se organizar consoante o seu sistema fiscal, mas, havendo países com o mesmo sistema fiscal que o nosso, Portugal pode servir de exemplo e ser pioneiro a nível mundial.
Já na legislação, até há pouco tempo não existia nada, mas depois de alguma pesquisa descobrimos que a região de Trento e Bolzano, em Itália, que é um governo regional, já tem alguma legislação, o que não admira porque os italianos sempre foram muito dinâmicos na área do Enoturismo. Se não nos apressarmos, qualquer dia outros países passam-nos à frente, como é costume!
O Enoturismo em Portugal consegue organizar-se com um todo ou terá de ser feito um trabalho região a região?
É necessário um trabalho de formiguinha nas regiões para depois trabalhar o todo. Há problemas transversais às regiões como, por exemplo, a falta de mão de obra ou a formação, mas problemas muito específicos em cada uma delas que têm de ser analisados individualmente.
O Douro, por exemplo, é uma região fantástica para a prática de Enoturismo, mas é um território onde existem dificuldades de transportes, o terreno é acidentado e tem falta de pontes, o que obriga a perder muito tempo nas deslocações entre as duas margens do rio. Já no Alentejo, o território é mais amplo, maioritariamente plano, e há melhores condições de acesso para os Enoturismos.
Na APENO estamos desde o ano passado, apoiados pela Ageas Seguros, a promover os Fóruns Regionais do Enoturismo que têm sido um sucesso, e onde têm sido debatida não só a organização do setor com as entidades de vinho e turismo de cada região, mas também os pontos fracos e fortes de cada região. Esta análise permite-nos perceber ainda melhor os territórios para depois poder trabalhar num todo, na definição de uma melhor estratégia global.
Era bom que [o Turismo de Portugal] também estivesse ciente que o Enoturismo é uma atividade económica muito específica, e que é preciso saber trabalhá-lo
Do lado da promoção externa, quais os principais mercados a explorar para o Enoturismo em Portugal?
Segundo dados do Turismo, o número de dormidas de norte-americanos em Portugal em janeiro e fevereiro de 2023 cresceu mais de 65% face ao período homólogo e mais de 100%, comparado com os dois primeiros meses de 2019. Tendo em conta estes números e as ligações aéreas diretas existentes atualmente entre Portugal e os EUA, parece-me correto apontar ações de promoção de Enoturismo neste país.
O Brasil também é um mercado estratégico e o Canadá, que tem vindo a crescer em números de visitantes. Já na Europa, mercados como o britânico sempre foi importante para nós, assim como a Alemanha, França e, claro, a nossa vizinha Espanha.
E repito, ações de promoção têm de ser cada vez mais incisivas e direcionadas ao enoturismo e a turistas com cada vez maior poder de compra.
Por falar em promoção externa, o Turismo de Portugal tem olhado para o Enoturismo com um elemento importante na promoção de Portugal nos mercados internacionais?
Não. E não nos deitem areia para os olhos dizendo que o têm feito, com campanhas me-gigantes em Times Square ou nos aeroportos americanos que custaram milhares de euros.
Atrair turistas americanos não é a mesma coisa que atrair enoturistas americanos.
O Enoturismo agradece que se trabalhe o sector de uma forma bem mais incisiva e eficaz!