“Só herdámos problemas na área do turismo”
A mudança política no Brasil ditou também alterações na Embratur – Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo e na forma como o Brasil se está a promover a nível internacional. Em entrevista ao Publituris, Marcelo Freixo, novo presidente da agência, explica o que está a mudar, com destaque, desde logo, para a recuperação da marca “Brasil”.
Inês de Matos
SET quer sentar à mesa APAVT e ANAV para discutir se vale a pena duas figuras de Provedor do Cliente das agências de viagens
Turismo do Centro quer saber o impacto do turismo na região
“O cliente português é mais exigente que o espanhol”, admite José Luis Lucas (Hyatt Inclusive Collection)
Espanha multa cinco low cost em 179M€ por cobrança indevida de bagagem de mão [Atualizada]
600 aeroportos certificados na gestão do carbono a nível mundial
Museus e monumentos com novos preços de entrada a partir de 1 de janeiro
Ryanair ameaça retirar voos de dez aeroportos em França
São Tomé e Príncipe aumenta taxas aeroportuárias a partir de 1 de dezembro
Aviação brasileira vive melhor outubro da história
AHP debate restrições à circulação de autocarros no centro histórico do Porto com a Câmara Municipal
Foi um novo Brasil que a Embratur – Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo apresentou, recentemente, em Portugal. As recentes mudanças na política brasileira ditaram também alterações na promoção do país, que recuperou a marca “Brasil”, que tinha sido usada até 2019, e que está também apostado em tornar-se num destino sustentável.
Mas, para isso, é preciso que, depois da pandemia, os turistas regressem ao Brasil e descubram o que o destino pode oferecer além do Sol e Praia, produto que continua a ser responsável pela viagem de 50% dos portugueses que visitam o Brasil.
E é aqui que entra também a importância do transporte aéreo, que já recuperou praticamente a dimensão de 2019, estando mesmo a ser estudada a possibilidade de abertura de uma nova rota direta para Florianópolis, que para Marcelo Freixo “seria ideal” que pudesse vir a ser operada pela TAP.
A Embratur está com uma energia renovada. O que é que vai mudar, especificamente, na promoção do Brasil?
O Brasil está com uma energia renovada. Acho que o país mudou e a promoção que se faz é o país que temos para promover.
O Brasil, hoje, é um país com um compromisso com a democracia, é um país que tem responsabilidades com o meio ambiente, que oferece segurança para quem quer investir e para quem quer viajar.
É um outro Brasil. É um país comprometido com o papel das mulheres na política, portanto, é um Brasil que temos esperança que possa trazer de volta a valorização da cultura, das festas e da ciência. Por isso, é um Brasil muito diferente do que vivemos há quatro anos.
É este Brasil que vamos promover, que estamos a divulgar e que as pessoas vão visitar. As pessoas vão, de verdade, visitar um outro Brasil.
Essa mudança é visível, desde logo, pela recuperação da marca Brasil, que foi usada até 2019. Porque decidiu a Embratur recuperar esta marca e qual é a sua importância?
A marca Brasil foi criada em 2005, no projeto Aquarela, que foi pensado para criar uma identidade nacional, que não pertence a um governo, pertence a um país.
Esse projeto identificou diversas cores e cada cor representa uma forma de um estrangeiro olhar para o Brasil, através daquilo que ele identifica de mais valioso, seja a festa, o sol, o mar, a mata, a cultura ou a gastronomia. Tudo o que o Brasil oferece de rico e que faz com que as pessoas visitem o Brasil, foi o que gerou a marca Brasil.
Isso foi, de uma forma muito desastrosa, substituído por uma marca que não tinha nenhum estudo, não tinha nenhum sentido e não dialogava. A marca Brasil dialoga, o Brasil dialoga. Por isso, retomámos imediatamente esta marca, porque ela não pertence a um governo, pertence a um país. E ajuda-nos na promoção do Brasil porque nos ajuda a transmitir a nossa identidade.
Retomámos imediatamente esta marca porque ela não pertence a um governo, ela pertence a um país. E ajuda-nos na promoção do Brasil porque nos ajuda a transmitir a nossa identidade
A nível de produtos turísticos, o Brasil é um destino que continua a ser muito conhecido pelo Sol e Praia, nomeadamente em Portugal, mas o Brasil é muito mais que isso. Que produtos vai o Brasil promover com mais força, nesta nova fase da Embratur?
Sim, o Sol e Praia, no Brasil, é muito forte e isso tem razão de ser. Temos um litoral imenso e diverso, desde as praias de Florianópolis – e nesse momento discute-se a possibilidade de haver um voo direto para Florianópolis -, às praias do Sudeste, ao Rio de Janeiro e o Nordeste inteiro. Por isso, o Sol e Praia é muito forte e compreendo quando o público português procura Sol e Praia no Brasil, 50% dos portugueses que vão ao Brasil procuram Sol e Praia.
Mas o Brasil não é só Sol e Praia, temos cultura de serra, Gramado, a floresta amazónica, o Pantanal, Bonito, as Chapadas que são incríveis, assim como as cachoeiras, que oferecem outra conexão com a natureza.
E o Brasil tem ainda a riqueza dos povos indígenas, que estão dentro de um campo antropológico, também da preservação da floresta – porque quando se fala em preservar a floresta, fala-se também em preservar os povos da floresta -, temos turismo de negócios que é crescente no Brasil e não só em São Paulo, e temos um turismo de eventos que é também muito forte, tivemos os Jogos Olímpicos e o Mundial de Futebol, os eventos desportivos têm muita oferta no Brasil.
Por isso, o Brasil oferece muitos produtos, muitas possibilidades e destinos, que temos de organizar e segmentar para passar uma mensagem correta a quem nos vai visitar.
Falou na preservação das florestas e dos povos indígenas, o que se enquadra na questão da sustentabilidade, que é um fim que também está a ser invocado no turismo. O que é que o Brasil está a fazer para se tornar num destino sustentável?
Isso é decisivo. Depois de Lisboa, vamos para a Alemanha, um país que acabou de reatar com o Brasil o Fundo Amazónico. A Alemanha só fez isso por confiança no Brasil no que diz respeito ao tema ambiental e climático, e isso já indica uma mudança do mundo em relação ao Brasil.
O governo Lula escolheu a ministra Marina Silva para o meio ambiente e vai criar uma autoridade climática. Pela primeira vez, vamos ter uma autoridade destas no Brasil. E criámos também o Ministério dos Povos Tradicionais, que é liderado por uma indígena. Isso mostra que não são só intenções, já podemos falar de ações concretas.
A própria Embratur também criou uma gerência climática e ambiental. Por isso, hoje, a Embratur tem, nos seus quadros, uma gerência que é composta por um professor da Universidade de Brasília e que é um dos grandes especialistas do Brasil na questão ambiental e climática, que será o gerente da Embratur para essas matérias.
Isso acontece, não só para que possamos promover o turismo para áreas em que a visita turística gera renda, crescimento de emprego e conservação, mas também porque temos, hoje, na floresta amazónica, diversas atividades económicas ilegais, que ameaçam a floresta e acreditamos que o turismo pode ser uma atividade económica legal para substituir essas atividades, ao mesmo tempo que contribui para a preservação porque ninguém vai destruir um lugar onde quer voltar.
O turismo também gera conservação.
E para os potenciais turistas, como é que o Brasil está a passar essa mensagem de que se está a tornar um destino sustentável?
Temos algumas iniciativas. Em primeiro lugar, temos uma estratégia de chamar jornalistas para visitarem o Brasil em alguns destinos específicos. Tivemos agora o Carnaval, que foi um sucesso. Este foi o primeiro Carnaval depois da COVID-19 e não houve nenhum incidente de segurança pública, isso mostra que somos um país capaz de receber turistas com segurança. Se o Brasil é capaz de receber turistas com segurança no Carnaval, é capaz de receber turistas com segurança em qualquer época do ano porque o Carnaval leva uma enorme quantidade de pessoas às ruas. E o Brasil demonstrou que é um lugar seguro para se visitar.
Tivemos jornalistas franceses visitando o Brasil durante o Carnaval. Estiveram no Rio de Janeiro, escreveram sobre isso e, hoje, a França começa a olhar para o Brasil de outra maneira.
Agora, estamos também a selecionar jornalistas para visitar Maceió e Alagoas. Certamente, também vamos ter muitos artigos de jornalistas portugueses e queremos fazer isso também para as festas de São João, que são muito tradicionais e importantes no Nordeste.
Portanto, este é um caminho para divulgar este novo Brasil de que estamos a falar, através da imprensa mundial. E há outro, que é através das agências de turismo, com quem temos feito inúmeras reuniões.
Temos muitas agências interessadas em levar o seu púbico ao Brasil e que têm de ser parceiras da Embratur. Esse é um caminho muito concreto.
Depois, temos a promoção nos países que são nossos parceiros e que precisamos organizar de forma mais qualificada para devolver o Brasil aos catálogos e ao circuito imaginário da população que gosta do Brasil.
Nesse momento discute-se a possibilidade de haver um voo direto para Florianópolis
Voltando à segurança, que é algo fundamental para o turismo, há pouco tempo estive num evento do Turismo do Rio de Janeiro, que explicou o trabalho que vem sendo feito na questão da segurança, até criando delegacias especificas para o turismo. Essa poderia ser uma estratégia para expandir ao resto do país?
Sem dúvida, acho que precisamos de falar muito sobre isso porque existe uma ideia de insegurança no Brasil que não corresponde à realidade. 93% dos portugueses que visitaram o Brasil querem voltar e ninguém voltaria se não se tivesse sentido seguro. Acho que um dos maiores dados que comprovam a segurança que o Brasil oferece é quando o turista diz hegemonicamente que quer voltar. Esse é um dado muito real.
Mas as delegacias especializadas são iniciativas importantes e que dão certo no Rio de Janeiro.
Ligações aéreas
Revelou que se estão a estudar voos diretos para Florianópolis, o que é que se está a estudar em concreto?
É um estudo, por enquanto, é só um estudo.
Poderia ser uma rota para a TAP?
Seria ideal que fosse a TAP.
Como está, neste momento, a operação aérea no Brasil e a conetividade para a Europa, já recuperou o nível pré-pandemia?
Recuperou bastante mas ainda não atingiu a normalidade pré-pandemia.
Em 2005, o Brasil recebeu mais de 300 mil portugueses e o ano passado recebemos 150 mil. Portanto, houve uma recuperação mas ainda não ao ponto do nosso melhor momento e isso tem a ver com o preço das passagens.
A Embratur já conversou com a LATAM, com a Azul e com a GOL, as empresas que operam no Brasil, todas são parceiras e querem ampliar os voos para destinos turísticos. Também conversámos com a American Airlines e com a TAP.
A TAP demonstrou grande interesse no Brasil, diz que o Brasil mora no coração da empresa e de Portugal e que, por isso, quer ampliar a operação.
Mas temos, hoje, um problema concreto, que é o preço do combustível, todas as companhias dizem a mesma coisa, o preço do combustível teve um crescimento de mais de 400%, o que tem a ver com a guerra e com uma série de fatores. Não é algo que caiba à Embratur resolver, mas temos de mediar as facilidades que podem ser feitas num destino importante e que levem as empresas a querer abrir novos voos para o Brasil.
Existe uma ideia de insegurança no Brasil que não corresponde à realidade. 93% dos portugueses que visitaram o Brasil querem voltar e ninguém voltaria se não tivesse se sentido seguro
A TAP revelou que a operação para o Brasil está praticamente nos níveis pré-pandemia. Isso dá-vos boas perspetivas de virem a assistir a um aumento de portugueses já este ano?
Sim, é o que mais queremos. Temos conversados com as mais importantes agências de turismo e queremos facilitar para que os pacotes turísticos sejam oferecidos e possamos ter um número maior de portugueses já este ano.
Também têm tido negociações com operadores turísticos portugueses, que organizam charters?
Sim, claro, temos essa prática já em Maceió e Alagoas. Este é um destino onde os charters já vêm a acontecer e que esperamos que continuem.
Adoraria poder dizer que herdámos um trabalho organizado, com dados, mas não foi nada disso. Só herdámos problemas na área do turismo, não tem nenhuma herança de qualidade e com dados, portanto, estamos partindo do zero
E que perspetivas para este ano, no mercado português, gostaria de avançar?
Não tenho, sei que a imprensa adora números, é normal, mas acho que precisamos primeiro de criar um diagnóstico porque não herdámos nada de bom. Adoraria poder dizer que herdámos um trabalho organizado, com dados, mas não foi nada disso. Só herdámos problemas na área do turismo, não tem nenhuma herança de qualidade e com dados, portanto, estamos partindo do zero.
Montámos uma gestão de big data e produção de informação para que possamos ter um diagnóstico da situação do turismo e, a partir daí, podermos dizer onde queremos chegar. A meta não é um desejo, é um planeamento, vamos fazer X para chegar a Y, mas se não sei onde estou, não vou conseguir saber onde vou chegar.
Mas, certamente, vamos estar num crescente muito imediato de turistas.