“Pretendemos que os nossos associados disponham das ferramentas necessárias para serem empresas mais sustentáveis”
Não é de hoje a “preocupação” com a temática da sustentabilidade. Aliás, recuando a 2016, já o tema era debatido num dos congressos da APAVT. Por isso, Pedro Costa Ferreira, presidente da associação, considera que “as agências e os operadores turísticos têm um papel preponderante na promoção da sustentabilidade no setor do turismo”.
Victor Jorge
A Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT) é uma das sete parceiras do projeto SUSTOUR que visa promover a sustentabilidade entre as agências de viagens e operadores turísticos europeus através de uma abordagem orientada para o negócio. Em entrevista ao Publituris, Pedro Costa Ferreira, presidente da APAVT, salienta que “cada vez mais, temos de exercer a nossa capacidade de influência junto dos nossos parceiros a montante, para poder dar resposta às exigências a jusante”. Tudo porque, a muito breve prazo, “não haverá condições de financiamento competitivas, se a empresa não provar ter um comportamento de acordo com os critérios de sustentabilidade”, admite o presidente da APAVT.
A APAVT é parceira do projeto SUSTOUR que visa promover a sustentabilidade entre as agências de viagens e operadores turísticos europeus. Que importância tem este projeto e iniciativa para o mercado nacional e, claro, para os associados da associação?
No limite, tem a importância da sobrevivência no médio/longo prazos. Vivemos em tempos de emergência climática, vivemos importantes desafios sociais, o mundo exige ação e o nosso setor, como todos os restantes, não sobrevive se não atender a estes desafios.
O «Flygskam» (vergonha de viajar de avião), iniciado em 2018 na Suécia, tem já reflexos noutros países, como a Holanda, cujo Governo fala em triplicar o valor da taxa de viagem para desencorajar as viagens de curta distância, ou a França, que está a discutir a suspensão de voos que possam ser substituídos por viagens de comboio. Ficar à margem desta realidade é, além da questão fundamental do civismo, um verdadeiro suicídio empresarial, e nós estamos a tentar alertar e dotar os nossos associados de ferramentas que os apoiem a integrar a sustentabilidade nas suas práticas.
A sustentabilidade entrou, definitivamente, no léxico do setor do turismo. No caso das agências de viagens e operadores turísticos nacionais, existe, de facto, a preocupação de fomentar essas capacidades?
As agências e os operadores turísticos têm um papel preponderante na promoção da sustentabilidade no setor do turismo, pela sua posição de charneira no negócio. Temos, cada vez mais, de exercer a nossa capacidade de influência junto dos nossos parceiros a montante, para poder dar resposta às exigências a jusante. Agora, naturalmente que esta preocupação tem de se integrar na estratégia global de cada empresa, até porque, como é sabido, estamos a dar os primeiros passos na recuperação económica da atividade, em clima de muita incerteza, e isso é uma tarefa extraordinariamente exigente.
Hoje em dia será possível a um agente de viagens operar sem ter a questão da sustentabilidade em mente?
Cada vez menos. Até porque existe todo um ecossistema e novos condicionamentos, inclusive legais, que nos vão obrigar a tal. O acesso a fundos e financiamentos ou a spreads mais atrativos, a pressão dos nossos parceiros e dos nossos clientes, este é um desígnio global que é imparável.
Uma das vantagens desta certificação Travelife é que nos fornece várias ferramentas que nos ajudam a implementar tudo isto de forma mais facilitada
Da parte do cliente, existe essa preocupação e prioridade em saber se o agente ou operador opera, tendo em conta estas questões da sustentabilidade?
Sim, a diferentes velocidades e intensidades. Do ponto de vista do incoming, é notoriamente prioritário, sobretudo para quem trabalhe com mercados mais sensíveis a estas questões, caso dos nórdicos, mas também dos mercados da Europa Ocidental. Também no corporate se verifica uma crescente preocupação das empresas relativamente à escolha de práticas e parceiros com políticas de sustentabilidade. O outgoing será, porventura, a atividade onde a prioridade se fará sentir menos, mas acreditamos que a sensibilidade para estas questões chegue mais depressa do que poderemos supor. Se para a maioria de nós esta é uma aprendizagem, para os nossos filhos nem se colocará outra forma de estar.
O bom aluno português
O que falta aos agentes, em Portugal, para operarem segundo estas competências da sustentabilidade?
A certificação Travelife integra 233 critérios de sustentabilidade, em todas as vertentes ESG (Environment, Social, Governance) dos quais 159 são obrigatórios. Diria que falta, acima de tudo, a integração da sustentabilidade na visão e no dia-a-dia da gestão, nas metas da empresa, na organização e no reporte estruturado. Uma das vantagens desta certificação Travelife é que nos fornece várias ferramentas que nos ajudam a implementar tudo isto de forma mais facilitada.
A realidade, no que concerne os agentes de viagens e operadores turísticos, é muito diferente da existente no resto da Europa? Portugal está muito atrasado?
O Norte da Europa, em primeiro lugar, e parte da Europa Ocidental, designadamente a Alemanha e Países Baixos estão, inquestionavelmente, na vanguarda das práticas e preocupações com a sustentabilidade, que diminuem quando rumamos a Sul. No entanto, há que dizer que, em Portugal, temos tido uma adesão que, inclusive, supera a de outros países meridionais. Não só nas agências de viagens, mas devo dizer que a ação do Turismo de Portugal neste domínio, em que temos participação ativa, também tem sido muito meritória.
Foi a pandemia que veio acelerar esta necessidade ou este projeto já era algo que estava a ser desenvolvido?
A pandemia, pelo contrário, atrasou o projeto SUSTOUR. Estava já a ser desenvolvido, mas variadíssimas vicissitudes, decorrentes desta crise, levaram a que só arrancasse agora.
Que valor económico tem, de facto, ter estas competências no âmbito do projeto SUSTOUR?
A muito breve prazo, não haverá condições de financiamento competitivas, se a empresa não provar ter um comportamento de acordo com os critérios de sustentabilidade. Mais tarde, mas não tão distante assim, simplesmente não terá clientes. O valor económico confunde-se com a preservação do próprio negócio.
O papel da APAVT
Que papel tem a APAVT neste processo de impulsionar e desenvolver este projeto junto dos seus associados?
É, sobretudo, um papel de divulgação, diria que, por vezes, de quase evangelização, mas que fazemos absolutamente conscientes de estarmos a cumprir com a nossa missão, que é a de apoiar os nossos associados. Há muitos anos que falamos de sustentabilidade – recordo que já no congresso de 2016 tivemos um painel dedicado a este tema, voltamos a abordá-lo no congresso de 2021, fomos a primeira associação portuguesa a assinar a “Declaração de Glasgow”, compromisso relativo à emergência climática, assinámos um protocolo com a Travelife e integramos o grupo de associações parceiras do programa SUSTOUR da UE. Pretendemos que os nossos associados disponham das ferramentas necessárias para serem empresas mais sustentáveis, e além da promoção deste tema, estamos mesmo a prestar apoio técnico nas candidaturas.
Para um agente se candidatar a este projeto, o que é necessário e que custos possui?
As boas notícias são o facto de que, por ser associado da APAVT, pode beneficiar do financiamento da UE através do programa SUSTOUR, de que somos uma das sete associações parceiras. Ultrapassada que está esta questão, basta ter a vontade e a determinação de levar a cabo um processo de certificação que, não sendo difícil, não deixa de ter a sua complexidade e exigir alguma dedicação. É exatamente essa complexidade e dedicação que granjearam a reputação de que a Travelife hoje usufrui na Europa e no Mundo.