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Opinião

O Tribunal do Luxemburgo e a sua profunda influência no Direito do Turismo

Em breve, para além da reforma da diretiva das viagens organizadas, dos direitos dos passageiros do transporte aéreo, há ainda que contar com a reforma do TJUE.

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O Tribunal do Luxemburgo e a sua profunda influência no Direito do Turismo

Em breve, para além da reforma da diretiva das viagens organizadas, dos direitos dos passageiros do transporte aéreo, há ainda que contar com a reforma do TJUE.

Carlos Torres
Sobre o autor
Carlos Torres

Encontrei recentemente num aeroporto, o primeiro Advogado Geral português no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), o Dr. Cruz Vilaça, o qual, enquanto secretário de Estado da Integração Europeia, conduziu, em 1981/82, as negociações de adesão às Comunidades Europeias, sendo mais tarde Juiz e presidido ao Tribunal Geral.

O meu estágio coincidiu com a adesão de Portugal às Comunidades Europeias, em janeiro de 1986, sendo que a licenciatura não nos tinha preparado minimamente para a nova realidade do Direito Europeu e das instâncias comunitárias, designadamente jurisdicionais. Algo incompreensível num momento em que o país despontava para uma oportunidade de transformação, certamente a maior da minha geração, logo a seguir à instituição da Democracia, em 1974.

Por essa razão foi decisiva uma conferência que a Ordem dos Advogados promoveu logo após a adesão, tendo como orador o Dr. Cruz Vilaça, que nos dirigiu preciosos alertas sobre as profundas mudanças que iriam ocorrer e o esforço de preparação que nos esperava.

Com o voo atrasado falamos demoradamente, tendo para além de lhe agradecer os ensinamentos que então nos transmitiu, narrado a profunda influência que o TJUE teve em áreas emergentes como o Direito do Turismo e das Viagens.

Com efeito, pouco tempo depois da adesão, surgiu, em 1990, a primeira direciva das viagens organizadas, uma referência mundial na proteção dos consumidores, na qual o TJUE teve um extraordinário papel na densificação das suas normas.  Não se confinando à letra da lei, antes apurando criativamente o sentido da norma, perscrutando a intenção do legislador, atualizando a sua vontade à luz dos novos condicionalismos e formas de comercialização, maxime da internet que alterou significativamente o paradigma da comercialização.

No pioneiro caso Dillenkofer (C-178/94), decidindo que a transposição intempestiva ou incorreta de uma diretiva gera responsabilidade do Estado-Membro perante os consumidores prejudicados pela falência de operadores turísticos. A transposição, deveria ter ocorrido até 31 de dezembro de 1992, pelo que os consumidores alemães estariam, não fora o atraso do Estado alemão, protegidos contra as falências de operadores turísticos ocorridas no verão de 1993.

Muitos anos mais tarde, terá certamente o caso Dillenkofer pesado nos decisores alemães, aquando da falência da Thomas Cook. A Alemanha fez a transposição do novo quadro europeu das viagens organizadas (Directiva 2015/2302/UE) atempadamente, mas incorretamente ao permitir a limitação da responsabilidade da seguradora, gerando, assim, um buraco de centenas de milhões de euros que teve de ser suportado pelos contribuintes alemães.

Considerando expressamente uma violação da Diretiva de 1990 a limitação da responsabilidade a uma percentagem do volume de negócios, surge-nos o caso Recheberger (C-140/97).

Por seu turno, o caso Verein für Konsumenteninformation (C-364/96) está na origem da solução consagrada na atual diretiva que prevê o pagamento do alojamento anterior ao repatriamento, permitindo que os turistas que não fiquem retidos no hotel em consequência das dívidas do operador. O casal Hofbauer tinha adquirido um package para Creta, mas tiveram de pagar o alojamento exigido pelo hoteleiro para poderem fazer o check-out. O TJUE não aceitou a interpretação literal de que o repatriamento se confinaria ao pagamento do transfer e do voo de regresso.

No caso Blödel-Pawlik (C-134/11) a circunstância de o operador nunca ter tido a intenção de realizar a viagem não permitiu à seguradora eximir-se do pagamento ao consumidor invocando o comportamento fraudulento da empresa.

O conceito de proteção efetiva, desponta numa situação em que os consumidores tinham sido indemnizados em cerca de um quinto do valor.  O caso Baradics (C-430/13) inspira a efetividade exigida pela atual lei, ou seja, têm de estar garantidos os reembolsos de todos os pagamentos efetuados pelos viajantes.

Quando chegamos à segunda Diretiva das Viagens Organizadas (2015), muitas das suas normas refletem os avanços decorrentes das decisões do TJUE nesses vinte e cinco anos.

Curiosamente, o novo quadro europeu refere expressamente uma decisão do TJUE de 2002, envolvendo uma agência de viagens portuguesa e um consumidor nacional. Trata-se do célebre caso Gonçalves Garrido em que a proteção do consumidor foi estendida da tradicional brochura (pré-combinação dos serviços pelo operador turístico) à escolha de serviços de viagem realizada pelo consumidor e transmitida à agência de viagens.

São também inúmeras as decisões do TJUE em matéria dos direitos dos passageiros do transporte aéreo.

Um elevado número de casos em todas as áreas, leva a que esteja em curso uma reforma do Tribunal do Luxemburgo, uma importante instituição que garante uma interpretação uniforme da legislação da União Europeia nos 27 Estados-Membros.

Sobre o autorCarlos Torres

Carlos Torres

Jurista e professor na ESHTE
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