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Opinião

Legislar no enoturismo: a experiência italiana

O turismo e o vinho compartilham uma restrição comum de desenvolvimento, sustentabilidade ambiental, social e económica. No entanto, à medida que cresce a importância do enoturismo é compreensível que se vá sentindo a necessidade da sua regulamentação, tal como sucedeu noutras áreas do turismo.

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Legislar no enoturismo: a experiência italiana

O turismo e o vinho compartilham uma restrição comum de desenvolvimento, sustentabilidade ambiental, social e económica. No entanto, à medida que cresce a importância do enoturismo é compreensível que se vá sentindo a necessidade da sua regulamentação, tal como sucedeu noutras áreas do turismo.

Carlos Torres
Sobre o autor
Carlos Torres

1)      A crescente afirmação do enoturismo
O turismo enogastronómico em geral e o enoturismo em particular, têm registado uma crescente afirmação, mercê de um conjunto de atributos muito positivos, maxime levando o turismo a outras partes do território, uma das formas de reduzir a carga no litoral. A vinha que qualifica fortemente a pisagem, surge como como o driver da viagem.

A ligação do paradigma da sustentabilidade com o enoturismo é mais fácil do que com outro tipo de actividades económicas e até com outros produtos turísticos. As práticas de sustentabilidade ainda se encontram numa fase inicial nos sectores primário e terciário, mas para a maioria dos profissionais da fileira do vinho, está bem presente a preocupação intergeracional, deixar a terra em melhor forma para os vindouros. O turismo e o vinho compartilham uma restrição comum de desenvolvimento, sustentabilidade ambiental, social e económica.

No entanto, à medida que cresce a importância do enoturismo é compreensível que se vá sentindo a necessidade da sua regulamentação, tal como sucedeu noutras áreas do turismo.

2)      Itália e a disciplina legal do enoturismo

2.1 Leitmotiv
Em razão da importância económica do enoturismo em Itália, compreende-se que neste país tenha sido concebida uma disciplina legal pioneira, um pouco à semelhança da magnífica arquitetura enológica lá desenvolvida. O leitmotiv foi sobretudo de natureza fiscal, mas não se confina a esta vertente, constituindo um poderoso referencial ao nível mundial.

Em 2019, através de Decreto de 12 de Março, oriundo do Ministério da Política Agrícola Alimentar, Florestal e do Turismo, foram aprovadas as orientações relativas aos requisitos e padrões mínimos de qualidade para o exercício da actividade enoturística.

No curto preâmbulo, salientam-se, entre outros aspectos, a importância das origens e potencialidades do enoturismo, um fenómeno cultural e económico susceptível de oferecer várias oportunidades para o crescimento do país.

Ainda em sede preambular ressalta a importância de valorizar as zonas de elevada vocação vitivinícola e de produção vitivinícola do território.

Por fim, no contexto de uma oferta turística integrada, promover o enoturismo como forma de turismo dotada de uma identidade específica, garantindo a valorização da produção vitivinícola do território. Daí a necessidade de consagrar linhas de orientação no que respeita aos requisitos e padrões mínimos de qualidade para o exercício do turismo do vinho.

Entrando no articulado, esclarece-se o objectivo do diploma: fixar os requisitos e padrões mínimos de qualidade para o exercício da actividade de enoturismo, com particular referência à produção vitivinícola do território (art.º 1º, nº 1).

Com o intuito de aplicar ao enoturismo a disciplina fiscal mais favorável concedida ao agroturismo, o n.º 2 considera-o uma actividade agrícola conexa (as outras categorias são cultivador, silvicultor e criação de animais) desenvolvida por um empresário agrícola.

2.2 Definição e actividades próprias do enoturismo
A definição de enoturismo, consta do nº 3 do art.º 2º. Compreende duas actividades, a formativa e a informativa relacionadas com a produção vitivinícola do território e o conhecimento do vinho. Destacam-se compreensivamente a Denominação de Origem Protegida (DOP) e a Indicação Geográfica Protegida (IGP) nas quais se desenvolve o enoturismo.

Enumeram-se, com carácter exemplificativo, as seguintes actividades como integrando o enoturismo:

·       Visitas guiadas às vinhas da empresa bem como às adegas;

·       Visitas aos locais de exposição das ferramentas e equipamentos empregues no cultivo da vinha, a história e a prática da actividade vitivinícola e enológica em geral;

·       Iniciativas de carácter didático, cultural e recreativo desenvolvidas nas adegas e vinhas, incluindo a vindima educativa ou turística;

·       Actividades de degustação e comercialização da produção vitivinícola da empresa, ainda que em combinação com alimentos, entendendo-se como tal os produtos agro-alimentares frios preparados pela própria empresa, mesmo manipulados ou processados, prontos para consumo.

2.3 Requisitos
O art.º 2º sob a epígrafe orientações relativas aos requisitos e padrões mínimos de qualidade para o desenvolvimento da atividade enoturística, enumera um vasto conjunto de requisitos.

O nº 1 determina que para além de deverem ser observados os requisitos gerais de natureza higiénico-sanitária e de segurança, os operadores que exercem atividades de enoturismo devem observar:

1)         Fixação de um período mínimo de funcionamento, ou seja, abertura semanal ou mesmo sazonal, num mínimo de três dias, os quais podem ser sábados, domingos e feriados;

2)         Existência de meios que permitam a marcação de visitas, preferencialmente informatizados;

3)         Obrigatoriedade de uma placa a afixar à entrada do estabelecimento, com os dados relativos ao acolhimento do enoturismo, e com um acervo informativo mínimo: horário de funcionamento, o tipo de serviço oferecido e as línguas faladas;

4)         Site ou página da empresa;

5)         Indicação dos lugares de estacionamento disponíveis na empresa ou nas proximidades;

6)         Material informativo sobre a empresa e os seus produtos, impresso em pelo menos três idiomas, incluindo o italiano;

7)         Exposição e distribuição de material informativo sobre a área de produção, sobre produções típicas e locais com particular destaque às produções com denominação de origem, tanto no setor vitivinícola como agroalimentar, bem como atrações turísticas, a arquitetónicas e paisagísticas do território em que se desenvolve a atividade de enoturismo;

8)         Instalações dedicadas e devidamente equipadas para a recepção e para o tipo de actividade efectivamente desenvolvida pelo operador enoturístico;

9)         Pessoal com experiência e formação, incluindo conhecimento das características do território, designadamente ao nível do proprietário da empresa ou familiares que o coadjuvem, colaboradores da empresa e colaboradores externos;

10)     A prova de vinhos no interior das caves deve ser efectuada com copos de vidro ou outro material, desde que não se alterem as propriedades organolépticas do produto;

11)     Realização de atividades de degustação e comercialização por pessoal com competências e treino adequados, incluindo: a) proprietário da empresa ou familiares que o auxiliem; b) funcionários da empresa; c) colaboradores externos.

O acompanhamento com os produtos vitivinícolas da empresa destinados a degustação deve ser efectuado com produtos agro-alimentares frios elaborados pela própria empresa, ainda que  manipulados ou transformados, prontos a consumir, observando os requisitos higiénico-sanitários previstos no legislação em vigor, e principalmente ligados às produções locais e típicas da região em que se desenvolve a atividade enoturística: DOP, IGP, Especialidade Tradicional Garantida,  produtos de montanha, produtos que se enquadrem nos sistemas regionais de certificação reconhecidos pela UE, produtos agroalimentares tradicionais  presentes na lista nacional publicada e atualizada anualmente pelo competente ministério  e da região em que se desenvolve a atividade enoturística (nº 2).

Em qualquer caso, da atividade de degustação são excluídas as actividades que constituam um serviço de restauração (idem).

Os aspectos de fiscalização, controlo e sancionatórios do diploma são definidos ao nível regional (nº 4).

Às quintas que realizem atividades de degustação, explorações educativas ou agroturismo mas que também pratiquem enoturismo, continuam a aplicar-se as respectivas disposições regionais (nº 5). Exemplificando, um agroturismo que desenvolva o enoturismo, aplicam-se os dois blocos normativos, o do alojamento e o enoturístico.

Ao nível regulamentar (portaria) pode estabelecer-se um logótipo de identificação de enoturismo, de indicação facultativa, para quem exerce a actividade enoturística (art.º 3º).

Sobre o autorCarlos Torres

Carlos Torres

Jurista e professor na ESHTE
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