“A maior parte dos jogadores é extremamente sensível ao preço”
A viver um bom momento, o golfe português enfrenta ainda alguns desafios, com destaque para a taxa de IVA a 23% e o Brexit, segundo Luís Correia da Silva, presidente do CNIG – Conselho Nacional da Indústria do Golfe.
Inês de Matos
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A viver um bom momento, o golfe português enfrenta ainda alguns desafios, com destaque para a taxa de IVA a 23% e o Brexit, segundo Luís Correia da Silva, presidente do CNIG – Conselho Nacional da Indústria do Golfe.
Portugal tem vivido um ‘boom’ turístico. Isto também se nota no golfe?
Julgo que, no turismo em geral, depois de dois anos de grande expansão do número de visitantes e das receitas, no ano de 2018 ainda houve crescimento, mas já houve algum abrandamento. Também no golfe aconteceu isso.
Em 2019, o ano começou fraco e, neste momento, estamos a sentir, no turismo em geral, uma melhoria nas reservas para o verão, sendo que, no golfe, também aconteceu mais ou menos a mesma coisa, porque estamos muito dependentes do mercado inglês. Depois de um início de ano com uma substancial retração, porque as pessoas estavam muito condicionadas devido ao Brexit e o seu potencial impacto, este mercado está a ter melhor comportamento, julgo que pelo facto desse assunto ter saído da ordem do dia e ter havido um adiamento.
Temos assistido a uma evolução positiva a partir do fim de abril e, para o verão, as reservas são positivas. Do ponto de vista do golfe, é menos significativo, porque os meses de junho a agosto são uma época muito baixa, o golfe funciona ao contrário do resto do turismo, mas estamos a sentir muito interesse para setembro e outubro, o que é positivo.
No golfe, estamos basicamente com os mesmos números de 2018, com um crescimento mínimo, na ordem das décimas, e deveremos chegar, no fim do ano, ao mesmo nível de receitas, talvez um pouco acima, porque houve uma decisão estratégica que foi tomada pela indústria, no sentido de reduzir os preços que tinham aumentado nos anos anteriores. Portanto, acredito que possamos chegar ao fim do ano com um número de voltas um pouco superior a 2018 e, provavelmente, no mesmo nível de receitas.
Estamos a falar de que valores?
A receita global do golfe ronda os 500 milhões de euros e o crescimento não vai ser muito significativo, nem sair muito deste valor, mas nas principais regiões de golfe, como o Algarve, o nosso grande destino de golfe, a receita deve rondar os 400 milhões de euros. Esta receita não aconteceria se não houvesse jogadores e campos de golfe no Algarve.
O golfe é fundamental para atrair turistas fora da época alta. Para o Algarve, esta é uma questão ainda mais fundamental, porque, se não fosse o golfe, grande parte dos hotéis e empreendimentos turísticos não teria clientes e, associado a isso, os restaurantes fechariam e as atividades económicas reduziriam, como o rent-a-car, que teria metade do rendimento fora da época alta. Portanto, o grande desafio que se coloca é, nas épocas altas do golfe – que começam em março e acabam em maio, e, depois, regressam em setembro e novembro-, temos muitos jogadores, mas, depois, há meses em que temos muito poucos jogadores, em que há um grande potencial de crescimento. Esta é uma questão que temos de gerir de outra forma, nomeadamente tendo mais portugueses e residentes a jogar nos campos nacionais.
Voltando ao Brexit, o adiamento foi positivo, mas não pode vir a trazer más notícias no final do ano? Não existe receio que se venha a sentir uma quebra a partir de outubro?
Trabalho no turismo há muitos anos e já vi ciclos muito altos e o seu contrário. O número de pessoas que viaja, hoje, não tem nada a ver com o número de pessoas que viajava há 30 anos, independentemente dos fenómenos, e o Brexit será, com certeza, mais um, que pode afetar pontualmente a atividade. Mas, hoje, as viagens são uma condição de qualidade de vida. Por isso, acredito que é provável que tenhamos algum efeito conjuntural, principalmente se houver desvalorização da libra face ao euro e especialmente se isso não acontecer face a outras moedas, como o dólar. É evidente que Portugal pode vir a ter uma descida.
Mas uma coisa é certa, mesmo que tenha um impacto pontual, vai haver um ajustamento, se não for este ano será no próximo, porque os ingleses gostam de vir a Portugal jogar golfe e somos, reconhecidamente, um destino de golfe para os ingleses.
O Turismo de Portugal teve uma reação importante, adiantou-se a outros países fazendo uma campanha de promoção para dizer que, independentemente das circunstâncias, os ingleses seriam sempre bem-vindos em Portugal e seriam tratados com excecionalidade. Foi uma situação que teve muito impacto no Reino Unido, com uma reação muito positiva dos ingleses.
Mas não podemos dar nada por garantido, tudo muda rapidamente e temos de trabalhar numa visão a longo prazo, melhorar a infraestrutura turística e dos campos de golfe, tornar as empresas mais competitivas e ter melhores pessoas a trabalhar, sempre numa perspetiva a longo prazo. Também temos de ter capacidade para intervir no momento, para minimizar os impactos, mas sempre na perspetiva de que isto é um ciclo com altos e baixos.
Desafios
Para essa competitividade seria desejável que a taxa de IVA do golfe voltasse a ser mais reduzida. O que é que o CNIG tem feito para pressionar o Governo nesse sentido?
Para sermos competitivos, temos, hoje, dois ou três grandes desafios, em que o CNIG está a trabalhar. O primeiro é um desafio de competitividade global, estamos na primeira liga do golfe europeu, mas precisamos de aumentar o número de jogadores.
Depois, temos um segundo desafio que é aumentar o número de jogadores nas épocas baixas do golfe. Se conseguirmos aumentar substancialmente os jogadores em janeiro/fevereiro e novembro/dezembro, também aumentamos o turismo em geral. É um desafio de sazonalidade que é alinhado entre o golfe e as outras atividades turísticas.
Mas, a questão fundamental é como é que as pessoas podem aceder aos destinos de golfe. E, nesse aspeto, há problemas, seja no aeroporto de Lisboa seja por falta de voos, especialmente para o Algarve. Se pudéssemos ter uma ponte aérea para o Algarve, nem digo com as características que existem entre Lisboa e Porto, mas uma mini-ponte aérea, com aviões mais pequenos, que oferecesse transporte rápido a quem quer jogar golfe no Algarve, isso seria fundamental.
Depois, há outro desafio que tem a ver com a escassez de recursos humanos. Este é, hoje, um grande desafio em Portugal, o mercado de trabalho é restrito e isso tem impacto nos custos de manutenção dos campos, que precisam de manutenção 365 dias por ano e há uma série de exigências de sustentabilidade que temos de cumprir para sermos considerados o melhor destino de golfe do mundo. Para isso, são precisas pessoas e é por isso que o CNIG está a trabalhar com a associação dos Green Keepers, porque temos de ter pessoas qualificadas nas receções, restaurantes e também nos campos, pessoas habilitadas a oferecerem uma boa experiência de golfe.
Depois, há o desafio do IVA. Estamos a trabalhar nisso e vamos apresentar um trabalho sobre essa matéria, porque a questão do IVA a 23% só afeta a competitividade do golfe português. Já tentei explicar isso, assim como os meus antecessores, várias vezes a várias instituições.
90% das voltas de golfe em Portugal, e principalmente das que são jogadas nas áreas turísticas, são jogadas por estrangeiros, pessoas que podem vir jogar para Portugal ou para qualquer outra parte do mundo. No golfe, Portugal compete com todo o mundo e, em determinadas circunstâncias, é mais barato para um inglês ir jogar golfe a Miami ou a qualquer outro destino nos EUA, do que vir para Portugal.
Nota-se esse efeito, ou seja, há jogadores que podiam vir para Portugal, mas que escolhem outros destinos pelo preço?
Nota-se que poderíamos ter preços mais competitivos se os fatores de custo fossem mais positivos e não tivéssemos de refletir parte substancial do custo dos 23% da taxa de IVA.
Há cerca de 4,25 milhões de jogadores na Europa, mas só 12 a 15 mil jogam em Portugal. É preciso perceber que neste total há uma percentagem que decide jogar independentemente do custo, porque conhece o campo e porque a experiência é fantástica, mas é uma percentagem mínima, a maior parte dos jogadores é extremamente sensível ao preço.
Existirá aqui um preconceito em relação ao golfe? Ou seja, muitas vezes há a ideia de que o golfe gera muito dinheiro, porque é um desporto para a elite e jogado por pessoas com muito dinheiro. Como é que se desmistifica esta ideia?
Desmistifica-se de forma simples: se um grupo de autarquias, depois do ciclo dos pavilhões gimnodesportivos que existem em todo o país, muitos com um número limitado de utilizadores e custos brutais, aceitasse o desafio de criar pequenos campos municipais – bastava que tivessem quatro ou seis buracos de golfe, um pequeno driving range e um edifício de apoio. Isso iria criar tradição de golfe. Se tivéssemos 20 ou 30 campos pelo país, teríamos dezenas de milhares de portugueses a jogar golfe.
Se olharmos para a realidade de outros países, grande parte dos campos é municipal, foi isso que levou ao grande ‘boom’ do golfe em Espanha. As pessoas habituaram-se a, no final da tarde, jogar uma ou duas horas, porque é uma atividade física e de bem-estar.
Portanto, a imagem elitista do golfe é errónea, também porque existe a ideia de que há um custo elevado para jogar golfe, mas isso é falso, há modalidades que têm custos muito mais elevados. E há campos em Portugal, mesmo entre os privados, em que o custo da assinatura é inferior ao custo dos health clubs. Portanto, não há nenhuma razão para que essa imagem exista, a não ser o preconceito, contra o qual temos de lutar. Para isso, era importante que existissem essas pequenas infraestruturas, num período de cinco a 10 anos poderíamos ter uma expansão muito interessante e uma mudança de visão.
Mercados
Quantos portugueses jogam, atualmente, golfe?
O número de federados anda entre os 14 e os 16 mil, o que inclui portugueses e estrangeiros residentes em Portugal. Além destes, poderá haver um número adicional de pessoas que se estão a iniciar e ainda não têm handicap, e que pode chegar aos mil ou dois mil. Infelizmente, o número de portugueses que jogam golfe não tem crescido e essa é uma questão importante, porque nos horários em que os nossos campos não são utilizados, poderiam ser usados em condições especiais – e normalmente os campos fornecem condições especiais para os portugueses, na maior parte, nem se aplica a taxa de IVA a 23%. Portanto, não é pelo preço que os portugueses não jogam golfe.
Os principais mercados estrangeiros que procuram Portugal devido ao golfe continuam a ser o britânico e o nórdico?
Dos dois milhões de voltas jogadas em Portugal, 1,5 milhões são de estrangeiros e as outras 500 mil de portugueses, sendo que os campos das regiões turísticas têm fundamentalmente jogadores estrangeiros, particularmente o Algarve, onde a percentagem é acima de 90%, porque é uma região de golfe turístico.
Quanto a nacionalidades, temos fundamentalmente três ou quatro nacionalidades, os ingleses são a maioria – e se juntarmos os irlandeses, então, estão em esmagadora maioria. Depois, os nórdicos que ficam sempre entre o segundo e o terceiro lugar, e os alemães. Não temos mais alemães devido à falta de transporte aéreo, o que leva a que estes jogadores vão para países que têm preços esmagadores, como a Turquia, Tunísia, Egito e o Dubai, que são destinos muito competitivos para os alemães. Deveríamos ter capacidade de fazer uma grande campanha de promoção de golfe no mercado alemão, associada a um maior número de voos.
Estes são os mercados fundamentais. Mas há um conjunto de mercados emergentes. Nos últimos anos, os jogadores franceses, italianos e belgas têm crescido e, visto que partiram de uma base baixa, estão a crescer de forma muito interessante.
No Brasil, o golfe também está a crescer, assim como na Argentina e, agora, há os mercados asiáticos. Para termos uma ideia, a zona de maior crescimento de campos de golfe, neste momento, é a China. Os chineses estão completamente enlouquecidos pelo golfe e os mercados de maior crescimento de golfe estão deslocados para a Ásia – como, aliás, acontece no turismo. Se pudéssemos ganhar uma pequena quota desse crescimento, estaríamos cheios.
Há também uma grande expectativa em relação aos EUA, a decisão da TAP de abrir vários destinos nos EUA abre a porta a que venham muitos americanos e isso é uma boa notícia. Mas temos de ter alguma visão para que venham também golfistas, até porque já tivemos, no passado, muitos jogadores americanos, que eram particularmente bons clientes.
Os golfistas são um tipo interessante de turista, há um estudo que diz que o golfista médio gasta 1.550 a 1.600 euros por estadia, um valor muito interessante e ainda mais fora das épocas altas. Se tivermos forma de fazer com que os golfistas dos grandes mercados dos EUA, Canadá e Ásia saibam que Portugal tem condições extraordinárias para golfe, poderemos ter um crescimento muito significativo.
A nível de campos nacionais, há novos projetos em carteira?
Durante a crise, houve um conjunto de empreendimentos que foram congelados e reavaliados, e que obedeciam a uma situação particular: o modelo de desenvolvimento olhava para os campos de golfe como um instrumento para desenvolver os hotéis. O golfe servia como atividade para sustentar o investimento, mas já se ultrapassou essa fase.
Neste momento, há apenas um campo para abrir em breve, na Quinta da Ombria, que está associado a um grande empreendimento e que foi desses que esteve congelado. Julgo que há mais uma ou duas situações em reavaliação, mas, cada vez mais, os campos têm que ser construídos de acordo com uma perspetiva de negócio ‘stand alone’. Isso vai exigir que, ao nível da oferta, olhemos para o mercado internacional e para o seu crescimento, para percebermos como podemos ter mais golfistas em Portugal. Creio que vamos passar por um período de ajustamento em que não vão aparecer muitos mais campos, enquanto não tivermos capacidade de atrair um maior número de golfistas.
Prémios e competições
Portugal tem vindo a ser consecutivamente reconhecido como melhor destino de golfe, nos World Golf Awards. Qual é a mais-valia destas distinções?
Os prémios são importantes, são um reconhecimento e um selo de qualidade. Não devemos ficar excitados por ganharmos um prémio mundial, mas é importante para os empresários e trabalhadores sentirem que o esforço e as práticas que introduzem são reconhecidas, e é algo que podemos usar para promover o golfe português nos mercados externos.
Em Portugal, as pessoas desconhecem o esforço extraordinário que foi feito para que os campos tenham qualidade e sejam sustentáveis, não apenas devido ao ambiente, mas porque isso ajuda a baixar custos. Hoje, os campos nacionais consomem menos água, têm sistemas de rega eficientes, aplicam menos pesticidas, têm praticas de manutenção menos agressivas e monitorizam um conjunto de indicadores que permitem olhar para a manutenção de forma inovadora. Isso traduziu-se numa melhoria substancial que está a ser reconhecida.
Mas, quando somos reconhecidos pela experiência de golfe, não é apenas pela qualidade dos campos, é uma mistura entre clima, gastronomia e serviço. Não quer dizer que todos os nossos campos sejam os melhores, mas oferecemos a melhor experiência.
A visibilidade para o destino é também a grande vantagem das competições de renome que Portugal recebe, como o Portugal Masters?
Essa é uma questão fundamental, as pessoas viajam para os sítios onde decorrem as grandes competições, isso é claro. Portanto, temos de ser competitivos, de mostrar aquilo que temos e as grandes competições, que, por alguma razão, não decorrem noutras partes do mundo.
É por isso que temos de manter o Portugal Masters e a nova competição Golf Sixies Cascais, e o ideal seria termos também um evento dedicado às senhoras, porque o golfe feminino está a crescer muito. Depois, seria importante distribuir os eventos pelo país, para que tivéssemos, ao longo do ano, várias transmissões televisivas para o mundo e vários artigos nos media.