“Existem propostas ambiciosas para fazer crescer o turismo na Guiné-Bissau”
Ciente do trabalho que ainda existe por fazer, o ministro do Turismo e Artesanato da Guiné-Bissau, Fernando Vaz, salienta ao Publituris que projetos e investimentos não faltam para o país.
Victor Jorge
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Com pouco mais de uma centena de unidades hoteleiras, a Guiné-Bissau ainda tem um longo caminho a percorrer enquanto destino turístico. Os passos estão, no entanto, a ser dados e o ministro do Turismo e Artesanato da Guiné-Bissau, Fernando Vaz, revelou ao Publituris alguns dos projetos e investimentos que estão a ser realizados no país. Desde a “construção do novo aeroporto, a projetos para turismo de massas”, à aposta num “eco resort vocacionado para um nicho de mercado muito elevado”, o certo é que o turismo é crucial para o atual Governo da Guiné-Bissau.
O turismo ainda é um setor pouco desenvolvido na Guiné-Bissau. O que é que estava a ser feito para imprimir outra ou uma nova dinâmica? Isto claro, antes da pandemia?
Concordamos e somos os primeiros a assumir que, efetivamente, o turismo é um setor pouco desenvolvido na Guiné-Bissau. Por outro lado, os vários governos não adotaram o setor turístico como sendo estratégico para o desenvolvimento económico, foi ficando para trás e não conheceu o desenvolvimento esperado e necessário.
Naturalmente que as coisas foram mudando ao longo do tempo e foi-se dando outra importância a este setor. Esta mudança tardia de paradigma conduziu ao surgimento de algumas unidades hoteleiras tanto no continente como nas ilhas Bijagós, que são um ponto de partida para toda a estratégia do desenvolvimento turístico no país.
Mas a oferta era escassa para a procura?
Bissau quase não tinha hotéis. Tinha meia dúzia de hotéis no período antes da pandemia e conta agora com mais de 100 unidades de alojamento, entre as quais alguns hotéis de três a cinco estrelas.
Na parte insular temos cerca de 50 unidades turísticas espalhadas por várias ilhas que oferecem vários tipos de turismo, desde o balnear ao de pesca, passando pelo turismo ornitológico, ecoturismo, etc.. O ecoturismo é, de resto, um dos mais fortes da nossa estratégia, com a particularidade das nossas ilhas serem muito ricas tanto em fauna como em flora.
Nos últimos dez anos, tem-se investido mais no setor turístico, não o desejável porque continua a haver falta de infraestruturas, mas mesmo neste contexto de carência podemos afirmar que já existe algum investimento que nos permite receber turistas de todo mundo com dignidade e com o savoir faire que o turismo exige.
Em 2016, em entrevista ao Publituris, admitia que “quem vier à Guiné-Bissau vai ficar surpreendido e não vai querer de lá sair”. Ainda mantém essa afirmação? O que é que prende o visitante à Guiné-Bissau?
Mantenho e enfatizo essa afirmação porque em 2016 não conhecia e não tinha feito as descobertas que entretanto fiz: das 88 ilhas que o arquipélago de Bijagós possui, descobrimos mais outras ilhas perpendiculares ao nosso continente – as ilhas de Pecixe, Geta, Komo, Caiar – e outras pequenas ilhotas.
Esta decalagem de cinco anos permitiu-nos descobrir maravilhas que não conhecíamos e que são locais de sonho. Isso aliado a um país onde o turista não é exposto à insegurança, podendo circular livremente em qualquer parte, sem perigo, e aliado também a um povo afável, que recebe o estrangeiro com as mãos abertas, são essas as características do povo guineense.
Mas essa ainda é uma questão que aflige o país, a insegurança?
Em qualquer região que o turista percorre vai constatar segurança, contrastando com a imagem que se projeta muito negativa da Guiné-Bissau, resultado das querelas políticas cíclicas, associando-as negativamente a todo país e ao seu povo, algo completamente errado. Temos aqui uma comunidade estrangeira bastante grande que vive em paz e em segurança, sem o flagelo dos assassinatos, dos raptos ou violência. Esta realidade constitui um dos fatores de integração muito forte dos turistas e um fator de hospitalidade e acolhimento onde o estrangeiro se sente em casa. Por isso, reafirmo que as pessoas quando vêm à Guiné-Bissau não vão querer sair, isto porque vão conhecer o paraíso na terra e, naturalmente, quererão permanecer nele.
Os investimentos
Mas voltando à questão das infraestruturas e da oferta, que parcerias estão a ser desenvolvidas, de forma a dinamizar o turismo na Guiné-Bissau no pós-pandemia?
Precisamos de todo o tipo de parcerias para a dinamização do turismo na Guiné-Bissau no pós-pandemia. Em primeiro lugar, como em todos os países do mundo, aconteceu uma hecatombe no setor, as nossas pequenas unidades tiveram de manter a maioria dos seus trabalhadores, sem que para o efeito gerassem receitas. O que precisamos, neste momento, é de apoiar o ressurgimento e a consolidação dessas unidades fustigadas pela pandemia e promover mais o nosso destino, para que venham mais turistas à Guiné-Bissau.
Por outro lado, para a dinamização do setor precisamos que as pessoas invistam na Guiné-Bissau e o Ministério do Turismo garante a estabilidade destes investimentos, através de seguros que existem a nível do Banco Mundial e da nossa Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO). Existem dois tipos de seguros que podem ser acionados, por forma a garantir o investimento estrangeiro e é muito fácil investir na Guiné-Bissau. Temos um código de investimento extremamente atrativo, que permite ao investidor expatriar cerca de 90% dos seus benefícios para qualquer parte do mundo, desde que legalmente justificado, existindo outros incentivos tais como um período de graça, sem pagar impostos, durante cinco a sete anos e outras benesses.
A criação de infraestruturas é fundamental para a dinamização do turismo na Guiné-Bissau. Precisamos de infraestruturas hospitalares, rodo-fluviais, portuárias, aeroportuárias, entre outras. Portanto, estamos de braços abertos para todos os que pretendam investir na Guiné-Bissau com o objetivo de dinamizar este setor – terão todo o apoio do Ministério do Turismo e do Governo da Guiné-Bissau.
“A criação de infraestruturas é fundamental para a dinamização do turismo na Guiné-Bissau”
Mas como refere, esses projetos precisam de investidores. No caso da Guiné-Bissau, de que tipo de investimentos estamos a falar?
Felizmente o que não falta são propostas de investimentos. Quase todos os dias, sem exagero, recebemos propostas de investimento para o setor turístico provenientes de diversas origens, sendo, na sua generalidade, financiamento em BOT (Build-Operate-Transfer), ou seja, são os próprios investidores que trazem o financiamento. Nós apoiamos e funcionamos como facilitadores para a instalação e criamos as condições para que os investidores prossigam os seus investimentos.
Isso quer dizer que a Guiné-Bissau continua aberta ao investimento estrangeiro, sem necessidade de um parceiro local para desenvolver negócios no país?
A Guiné-Bissau talvez seja um dos únicos países em África em que qualquer estrangeiro poderá constituir uma firma pertencendo-lhe a 100%. Não é obrigatório que haja um parceiro local na constituição de qualquer firma por estrangeiros. Portanto, continuamos completamente abertos.
Existem propostas e projetos ambiciosos para o país, com a pretensão de fazer crescer o turismo. Pode dizer-nos quais são, como vão ser implementados e qual o prazo para acontecer?
Existem propostas ambiciosas para fazer crescer o turismo na Guiné-Bissau. Temos o projeto de construção do novo aeroporto, que irá movimentar cerca de 2.000.000 de passageiros por ano, trazendo um incremento muito grande ao turismo, e, por outro lado, temos, também, projetos para o norte do país, para a zona de Varela, onde vamos apostar no turismo de massas, o turismo de pulseira, como Cabo-Verde, República Dominicana, Cuba e outros países, porque são praias enormes, dando continuidade a uma zona turística do Senegal que é o Capskiring.
Temos propostas dos Emirados para esta zona, para implantação de grandes unidades hoteleiras de 4 a 5 estrelas até 5.000 camas. Trata-se de um mega-projeto, que não será realizado a curto prazo, mas sim a médio prazo, e que oportunamente vamos, com certeza, divulgar pormenores. Com a realização da EXPO 2021, no Dubai, vamos estar presentes e conversar com os promotores deste projeto.
Temos também o projeto de um grupo espanhol para a construção nas ilhas de um eco resort virado para um turismo de luxo, um turismo de gama altíssima, um projeto que envolve também um investimento considerável e que está vocacionado para um nicho de mercado muito elevado.
Existem muitos outros, mas como se tratam de projetos, a seu tempo serão revelados.
A porta de entrada para qualquer país é o seu aeroporto. Referiu a construção de um novo aeroporto. O que mais nos pode adiantar relativamente a esse projeto?
Sim concordamos e temos consciência que o aeroporto é a porta de entrada de qualquer país. Neste momento, investimos cerca de sete milhões de dólares só no melhoramento da pista do aeroporto Osvaldo Vieira, que é o nosso atual aeroporto principal, e estamos ainda a melhorar as salas de embarque e desembarque, com a integração de salas VIP para os passageiros da primeira classe.
Para além disso, temos projetado um novo aeroporto entre os setores de Mansoa e Nhacra, a 30 quilómetros da capital Bissau, que será um dos aeroportos mais modernos da África ocidental e que será construído e financiado pelos Emirados, com um projeto e memorando assinado no ano transato entre o Governo da Guiné-Bissau e a firma dos Emirados.
“Quase todos os dias, sem exagero, recebemos propostas de investimento para o setor turístico provenientes de diversas origens”
Que companhias estão atualmente a voar para a Guiné-Bissau?
As companhias aéreas que estão atualmente a voar para a Guiné-Bissau são no total oito, nomeadamente, TAP, Euroatlantic, Senegal Airlines, ASKY, Cabo-Verde Airlines, Transair e Royal Air Maroc. De salientar que entre estas companhias, quatro ainda estão suspensas devido à atual crise pandémica, mas, brevemente, irão retomar os voos para a Guiné-Bissau.
O futuro pós-pandemia
Mas como é que o destino Guiné-Bissau enfrentou esta pandemia da COVID-19 e como vai sair dela?
Enfrentamos a pandemia como todo o mundo. A Guiné-Bissau não fugiu aquilo que é o concerto das nações no mundo. Nessa perspetiva, os impactos foram extremamente negativos, como em todo o mundo, principalmente, no setor do turismo, em que estivemos, cerca de um ano, com as portas completamente fechadas, com um impacto extremamente nocivo no setor. Enfrentamos esta pandemia, sobrevivendo, aliás, uma das características dos guineenses é a sobrevivência.
Mas como perspetiva a saída desta crise?
Vamos sair desta crise implementando políticas de dinamização do setor, nomeadamente, a retoma da atividade turística em máxima força e executando a maior promoção de sempre do destino, externa e internamente. Ação essa já em curso, como podem constatar em Portugal através dos outdoors nas principais vias de comunicação, auto-estradas de norte a sul, saída da Ponte 25 de Abril e da Ponte Vasco da Gama, entre outros locais estratégicos. Entre as várias estratégias, estas são aquelas que queremos enfatizar mais.
Já falou em paraíso. O que é que a Guiné-Bissau tem para oferecer a quem a visita? É um destino multifacetado ou unicamente sol e praia?
A Guiné-Bissau é um destino multifacetado, pode fazer-se sol e praia em quase todas as nossas ilhas e no continente, na região norte, nas praias de Pecixe, Geta, Komo-Caiar, Cassumba, pode fazer-se turismo balnear, de caça, pesca desportiva, porque a Guiné-Bissau é imensamente recortada, por rios do norte ao sul, sendo estes um viveiro de peixes e de diversas espécies marítimas.
Também se pode fazer a observação de espécies da fauna, desde búfalos, macacos, elefantes, leões, tigres, gazelas, cabras de mato, javalis, hipopótamos, tartarugas, enfim uma panóplia enorme de espécies que existem na nossa fauna.
Temos também o turismo de memória, porque passaram pela Guiné-Bissau milhares de portugueses que estiveram do norte ao sul do país. Este será um desafio e uma aposta do Ministério para breve: trazer essas pessoas de volta à Guiné-Bissau, para, na perspetiva do turismo de memória, reviverem os locais onde estiveram, que marcaram parte das suas vidas. Como disse, o destino oferece uma enorme diversidade.
“Temos um código de investimento extremamente atrativo, que permite ao investidor expatriar cerca de 90% dos seus benefícios para qualquer parte do mundo”
O futuro do turismo, a nível global, passa muito por apostas em conceitos de sustentabilidade e digitalização. Como é que esta visão é encarada por parte do responsável do turismo na Guiné-Bissau? A questão da sustentabilidade é fulcral no desenvolvimento do turismo no país?
Naturalmente que a questão da sustentabilidade é fulcral no desenvolvimento turístico do país, sendo o nosso arquipélago de Bijagós considerado Reserva Mundial da Biosfera pela UNESCO e estando inserido dentro de um ecossistema extremamente importante.
Nesta perspetiva, o desenvolvimento turístico preconizado pelo setor, especificamente para as Bijagós, tem regras muito rígidas. Por exemplo, não aprovamos construção de grandes unidades hoteleiras, ou seja, não haverá turismo de massas, as unidades hoteleiras são pequenas, variando de 20 a 60 ou 80 camas no máximo, dependendo do tamanho da ilha e do local em que estão situados. Alguns desportos náuticos são também proibidos, tipo a moto náutica, para preservar espécies como os nossos manatins, golfinhos, tartarugas, entre muitas outras, que com estes meios motorizados, naturalmente, fugiriam para locais mais calmos e mais recondidos.
A sustentabilidade é extremamente importante para nós e vamos até ao pormenor de termos em preparação uma lei que irá proibir a construção de foças sépticas e outras medidas, desde o aconselhamento de utilização de energias verdes, ou seja, energias saudáveis em vez de geradores. Todos os projetos, quando analisados no Ministério, têm em conta o impacto ambiental.
26% do território no continente é área protegida, e no sul temos as matas de Cantanhez, as lagoas de Cufada, o parque natural dos tarefes de Cacheu, parque de Dilumbi e Boé, que também são áreas protegidas com um habitat, uma fauna e uma flora própria e muito rica, onde algumas espécies estão quase em extinção. Todo o turismo projetado para estas áreas tem de garantir a sustentabilidade do ecossistema existente. A questão da sustentabilidade é indiscutível na Guiné-Bissau.
A proximidade à Europa é uma vantagem do destino Guiné-Bissau?
A localização privilegiada da Guiné-Bissau no cruzamento de três continentes, o europeu, o africano e o americano, a poucas horas de voo dos principais países emissores de turistas que estão situados na Europa e sem diferenças substanciais em termos de fusos horários, constitui, sem dúvida, uma vantagem competitiva importante no mercado turístico. Portanto, para a materialização dessas vantagens, são necessárias medidas, e vamos tomá-las, focando-nos na redução do custo de transporte aéreo para o destino, que é ainda um pouco elevado, comparando com os países da sub-região. Além disso, torna-se também fundamental a redução do custo do visto de entrada, fazendo com que isto seja um diferencial em relação à concorrência, trazendo assim mais turistas para o país.
Turismo de língua portuguesa
A generalidade dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) podiam e deviam explorar o facto dos países falarem a mesma língua e posicionar-se mundialmente como um destino diferenciador até por esse prisma? Ou até mesmo estabelecer parcerias entre eles ao nível da atividade turística?
Gostaria que assim fosse, que a generalidade dos PALOP explorasse os países que têm em comum a mesma língua, mas, infelizmente, a lógica de transportes coloniais persiste e quase que impede a ligação direta entre os PALOP. Nós temos ainda Portugal como placa hub para os PALOP.
Não há voos diretos entre os PALOP, salvo pequena exceção entre Angola e Moçambique que já existia desde a época colonial. Existia o voo direto Cabo Verde/Guiné, mas já não existe.
Como digo, a lógica dos transportes aéreos matrizados no período colonial persiste após quase 50 anos de independência e não fomos capazes de criar vias diretas de comunicação entre os PALOP e, naturalmente, que isso encarece mais os destinos, tornando-os pouco atrativos e competitivos.
É necessário que haja uma mudança de paradigma neste setor e acreditamos que caminhamos para lá com a existência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e outras organizações que nos fazem estar, todos os dias, mais próximos uns dos outros.
Como é que apresentaria a Guiné-Bissau a um desconhecido? E a quem já visitou o país, o que diria para regressar?
Quem já visitou a Guiné-Bissau, na sua maioria, irá regressar, assim sendo, não estaria muito preocupado em apresentar-lhes o país.
Preocupo-me mais com quem não conhece a Guiné-Bissau e que quer vir pela primeira vez. A esses diria, como costumo dizer sempre, venham à Guiné-Bissau, vão encontrar um dos países mais bonitos do mundo, pobre, contudo, com um dos povos mais tranquilos e pacíficos. Convido-vos a visitarem-nos e a fazerem o vosso juízo. Estaremos sempre à vossa espera e prontos para vos receber.