Das Tormentas à Boa Esperança
Por Luís Ferreira, Professor Especialista do ISAG – European Business School
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*Por Luís Ferreira, Professor Especialista do ISAG – European Business School
A fileira portuguesa do Turismo e Hotelaria tem recebido notícias agridoces. Se, por um lado, o avanço generalizado das campanhas de vacinação, aliado à crescente vontade e necessidade de evasão/viajar que uma maioria manifesta, trouxe esperança, por outro, o horizonte é tingido de pessimismo por uma gestão pública “ultra cautelosa” que procura conjugar o medo com políticas hesitantes de desconfinamento. Avanços e recuos enfatizam uma primeira evidência: a turbulência veio para ficar, obrigando a gerir com maior volatilidade, o que exige mais cuidado e maior determinação.
Além deste, a pandemia que sobressalta o mundo há demasiado tempo deixa-nos mais alguns avisos que nos confrontam com outras tantas questões que podem levar a melhores respostas.
O primeiro prende-se com sustentabilidade. Queremos continuar a apostar num turismo massificado e anónimo que destrói à passagem e deixa rasto de degradação? Mais regulação e restrições serão doravante mais aceitáveis para proteger o ambiente, o contexto ou o legado?
Enquanto alguns se apressam no anúncio de morte do turismo de massas, percebe-se que a transição será tudo menos pacífica. E sê-lo-á tanto a nível macro quanto micro: os países e “destinos turísticos” terão tanta dificuldade em reconstruir as suas propostas de valor e em adaptar as suas campanhas quanto as empresas em reinventar o seu negócio e encontrar novos mercados.
E estes novos mercados ocupam o segundo aviso. Tornando-se o turismo menos acessível – seja por contexto, custo ou disponibilidade –, será cada vez mais desejado, logo exigente, acentuando a tendência de ultrapersonalização. Intensificando o interesse por uma oferta diversificada, bem cuidada e integrada, o viajante quer ser tratado pelo nome e ter ofertas à sua medida; quer comodidades que o privilegiem, mas considerem o impacto ambiental, social e económico. Cada vez mais quer ir ao encontro de culturas e comunidades, isto é, mais do que localização e serviços, demanda experiências. E, embora assustador em dimensão e complexidade, este desafio é das maiores oportunidades que o nosso país pode ter, assim consiga adequar a riquíssima variedade de recursos e capacidades a competitivas estratégias de nicho de mercado.
Estarão os agentes da fileira preparados para estes novos (micro)mercados, onde o valor não vem da quantidade antes de uma exclusividade sustentável? Complementarmente, num momento de evolução sem precedentes, como podemos servir-nos dos avanços tecnológicos para estar mais próximo dos consumidores que realmente interessam: ouvi-los e interagir adequadamente, compreendê-los melhor e até conseguir antecipar alguns dos seus desejos e comportamentos, respeitando escolhas e privacidade?
Por fim, entendo que é nesta relação de proximidade que se jogará uma boa parte do futuro desta fileira. Proximidade a níveis distintos: entre entidades de governação/ supervisão e agentes; entre a academia e as empresas; entre concorrentes e parceiros de negócio; entre gestão e operação dentro de cada empresa; por fim, entre oferta e procura.
Relação que implica disponibilidade e atenção, empatia e capacidade para melhorar o bem-estar de quem recebemos. Curiosamente, estas aptidões são bem conhecidas no sucesso do turismo e da hotelaria portugueses. Temos de potenciar esse sucesso, abraçando sem hesitação três desafios: tornar claro para todos o paradigma competitivo que emerge, atualizar conceitos e propostas de valor e incorporar instrumentos e práticas – maioritariamente digitais – que reforcem o nosso dom natural de cuidar e bem-receber.
Tal como nos feitos de Quinhentos, a epopeia que enfrentamos é de monta. Vai ser preciso: visão clara e liderança decidida, novas naus e equipamentos mais sofisticados, a par de tripulações muito bem habilitadas e, sobretudo, bem alinhadas. É hora de gente valente, ousada e determinada para, de novo, transformar tormentas em esperança.