Fernando Santos, proprietário e diretor-geral da GlobalSea
“Continua a haver dúvidas sobre o produto cruzeiros para uma determinada franja de clientes”
Especializada em cruzeiros, a GlobalSea abriu em 2011 e tem vindo a trilhar um caminho de sucesso, à medida que também o produto de cruzeiros cresce em Portugal, apesar das dúvidas que ainda existem entre passageiros e até agências de viagens.
Inês de Matos
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Com um vasto conhecimento sobre cruzeiros, tendo inclusive já realizado 100 destas viagens, Fernando Santos, proprietário e diretor-geral da GlobalSea, falou com o Publituris sobre o trajeto desta agência de viagens especializada em cruzeiros e sobre o atual momento de um setor que está a crescer em Portugal mas que é ainda desconhecido para muitos clientes.
As especificidades que envolvem os cruzeiros levam a que ainda existam dúvidas para o público, assim como entre os próprios agentes de viagens. “O produto de cruzeiros é um produto difícil de se trabalhar”, admite Fernando Santos, explicando que, também por isso, a GlobalSea é procurada por agências generalistas devido ao seu conhecimento sobre este tema.
Queria começar pelo início, ou seja, quando é que nasceu a GlobalSea e porque que é surgiu a ideia de abrir uma agência especializada em cruzeiros? A GlobalSea surgiu em 2011, quando terminei o programa de cruzeiros na SIC Notícias. Trabalhei dois anos nesse programa e adquiri conhecimento sobre destinos, portos, sobre o que fazer a bordo ou o que não fazer. Na altura, já tinha tido uma experiência anterior com o InfoCruzeiros e achei que abrir a GlobalSea fazia sentido. Escolhi o nome GlobalSea porque remete para o mar global, para uma ideia de generalidade e de envolvência a nível mundial e, portanto, foi assim que surgiu o nome e a agência, focada essencialmente no turismo de cruzeiros.
A GlobalSea é focada nos cruzeiros mas também vende outro tipo de produto? 97% do nosso mercado, ou seja, aquilo que faturamos, é cruzeiros e aquilo que está associado aos cruzeiros, como voos, hotéis, excursões e tudo o que está à volta do turismo de cruzeiros. Mas, se houver um cliente que nos diga que o filho tem cinco ou seis anos e que gostava de ir à Disney, pois naturalmente temos o produto Disney, como temos Caraíbas, Marrocos e tudo o resto.
Se colocarmos isto numa outra dimensão e pensarmos na área da medicina, se calhar consegue-se perceber melhor. O médico de clínica geral trata de todas as patologias de uma forma geral e, depois, temos o especialista. Portanto, se uma pessoa tiver necessidade de ir ao oftalmologista, o clínico geral poderá direcionar o paciente para o especialista e nós, dentro da área do turismo de cruzeiros, consideramo-nos e somos considerados, pelos pares e pelos nossos clientes, como pessoas com experiência nesta área.
Para o passageiro, esse conhecimento que os agentes de viagens têm é fundamental, principalmente para um passageiro que nunca tenha feito um cruzeiro? Sim. Mais do que fundamental, é a melhor ajuda que pode ter. Os dados mais recentes da CLIA referem que 73% das pessoas que procuram cruzeiros falam com agências de viagem, nomeadamente agências especializadas e esse é o nosso âmbito. O nosso papel é importante porque conseguimos perceber os destinos – já estive em mais de 173 portos a nível mundial, já fiz 100 cruzeiros, conheci muitos países e muitos portos – e dar confiança ao cliente para ter a melhor experiência.
Principais dúvidas
Ainda há dúvidas por parte dos clientes quando chegam à agência? Continua a haver dúvidas sobre o produto cruzeiros para uma determinada franja de clientes. Há dúvidas porque a primeira pesquisa faz-se no online e a pessoa não tem noção se, por exemplo, ao sair de um determinado porto faz sentido sair de bombordo ou estibordo. Também não têm noção se o tipo de camarote é mais acima ou mais abaixo, mais à frente ou mais para trás. Muitas vezes, nem sabem que tipo de camarote precisam. Aquilo que o cliente vê quando faz uma pesquisa, normalmente, é se o camarote tem ou não varanda, ou então procura pelo preço e o preço não é denominador de tudo. Por isso, há pessoas que dizem, no final da história, que fizeram um cruzeiro e não gostaram. E se perguntarmos porque não gostaram, percebemos que foi porque não foi feito um diagnóstico exato daquilo que o cliente poderia ter. Colocando isto novamente no âmbito da medicina, percebemos que é importante conhecer a história clínica do doente.
Atribui essas dúvidas ao facto de as pessoas desconhecerem ainda o que é o produto de cruzeiros? O produto de cruzeiros é um produto difícil de se trabalhar. Não é por acaso que, a nível mundial, só cerca de 2% de pessoas é que fazem cruzeiros e, em Portugal, ainda menos. Portanto, é claro que há aqui alguma dificuldade de, às vezes, tomar a melhor opção.
Vendas de cruzeiros e extras
O que é que a GlobalSea costuma vender, só o cruzeiro ou vende também as viagens de avião e a parte das excursões, porque a GlobalSea também representa a Shore-2-Shore? Relativamente ao cruzeiro, sim, tentamos sempre que a experiência seja o mais abrangente possível e dar ao cliente toda a informação para que, quando toma a decisão de fazer um cruzeiro, saiba exatamente o que pode esperar. Não vendemos apenas o cruzeiro, há múltiplas coisas que podem ser tratadas. Tentamos vender e passar a informação sobre coisas necessárias, como o wi-fi, os restaurantes de especialidade, os acessos ao Spa ou os pacotes de bebidas, que são essenciais mesmo para quem não bebe álcool.
É importante, quando se fala com alguém que quer fazer cruzeiros, transmitir toda esta informação, porque é, basicamente, aquilo que nós faríamos se fôssemos nós a fazer essa viagem. Quanto às excursões, quando pensamos em fazer um cruzeiro é importante ter noção de que se podem fazer excursões e de forma económica. As excursões da Shore2Shore são bastante económicas quando comparadas com outras excursões, nomeadamente dos navios. As nossas excursões têm tido uma aceitação muito grande, nomeadamente por parte dos grupos de gestão, estamos com praticamente todos os grupos de gestão importantes em Portugal. As excursões de cruzeiros são determinantes na experiência que se vai ter no final da viagem.
Há essa consciência da parte do passageiro de que pode ter uma experiência mais interessante se comprar alguns serviços extra, nomeadamente as excursões? Sim, mas há aqui dois períodos, o período antes da pandemia, em que estávamos com uma determinada evolução e, chegados à pandemia, tivemos de fazer devoluções. Foi dramático para todos, os cruzeiros foram os primeiros a parar e dos últimos a regressar. Mas, após a pandemia, houve uma reativação, as pessoas retomaram as suas viagens de cruzeiro e, paulatinamente, foram redescobrindo o que se podia fazer. Inicialmente, as excursões eram feitas em bolha, mas tivemos sempre excursões e vendemos excursões por toda a Europa.
Terminado esse período, nos últimos meses, estamos com uma evolução de quase 70% face ao ano anterior. E isso tem uma razão de ser, é que as pessoas estão a reservar com mais antecedência. Tenho reservas de cruzeiros para 2025 e 2026 e isso é também fruto do esforço que as companhias estão a fazer, não é apenas da nossa influência, mas as pessoas estão a ficar sensibilizadas para a necessidade de reservar com antecedência.
Cruzeiros premium e vendas em 2024
E a nível de negócio em si, como é que está a correr 2024?Está a correr relativamente bem. Há uma evolução positiva face aos anos anteriores, apesar de 2023 ter sido um ano de ‘boom’ porque as pessoas ainda tinham vouchers para utilizar e o início do ano foi muito forte.
Este ano, está a correr bem, mas não com essa influência, as pessoas que tiveram dois anos sem viajar, viajaram duas ou três vezes no ano passado para esgotar os vouchers.
Entretanto, este ano temos outros problemas, nomeadamente no Médio Oriente, que vieram retirar a possibilidade de se viajar para esses sítios, e esses problemas tiveram influência nos destinos do Corno de África, que não sabemos quando poderemos retomar. É semelhante ao que se passou, há uns anos, com São Petersburgo e com Rússia, quando se deixou ir à Rússia e o Báltico sofreu com isso. Mas encontraram-se outros itinerários, como a Islândia, que é, neste momento, um destino muito atraente.
Há poder de compra em Portugal para cruzeiros premium? Há, acho que cada vez há mais. E isso leva-nos a outra questão, ou seja, quando falamos de luxo e quando falamos de expedição. Mas sim, sente-se que, de facto, as pessoas querem fazer este tipo de cruzeiros e temos pedidos, o que é sinal de que há dinheiro. Também tenho clientes que fazem cruzeiros na Antártida, naqueles navios que têm helicóptero e submarino, num produto que pode ir aos 30 ou 40 mil euros e também tenho vendido esse produto. Aliás, o primeiro casal de portugueses que fez um cruzeiro na Antártida num navio de expedição foi vendido por nós. Portanto, há mercado, é um mercado crescente, apesar de não ser fácil vender, mas quando se tem um trabalho mais especializado, são as próprias agências que vêm ter connosco porque conhecemos e temos os contactos certos.
Na GlobalSea, quais são as companhias mais solicitadas por quem chega à agência? Há aqui uma questão que tem a ver com a fidelização e os programas de fidelização. Quando um cliente atinge um determinado estatuto, vai querer continuar a viajar com essa companhia para manter esse estatuto. Isso também leva a alguns benefícios que podem estar associados ao estatuto do cliente. Claro que há pessoas que dizem que são fiéis a uma determinada companhia e é nessa companhia que querem viajar, e não estou a falar de nenhuma companhia de cruzeiros em concreto. Mas, depois, há pessoas que querem experimentar, que já viajaram numa ou noutra e querem viajar numa companhia com outras características e isso também vai mudando em função da idade. À medida que as pessoas vão tendo maior experiência de vida e de viagens, querem coisas diferentes.
E como estão as perspetivas para o inverno, já há vendas? As expetativas para o inverno são positivas mas aqui temos de ver de que inverno estamos a falar porque o nosso inverno é o verão das Caraíbas e nunca vendi tanto Caraíbas como agora. É, de facto, um dos destinos mais vendidos que temos, está no Top3. Além das Caraíbas, este ano temos vendido muito Adriático, com saídas de Veneza e Atenas, depois temos o Norte da Europa, com os Fiordes, e finalmente as Caraíbas, creio que estamos a vender mais Caraíbas do que Mediterrâneo Ocidental.
Isto é fácil de perceber, se olharmos para o mapa, o que é que é mais próximo? É o Mediterrâneo Ocidental, além das saídas de Lisboa, que são muito importantes – este ano, só a MSC Cruzeiros tem 19 saídas de Lisboa, a começar em abril. Por isso, percebemos que, quem se inicia no turismo de cruzeiros, começa pelo Mediterrâneo Ocidental, depois vai fazer o Mediterrâneo Oriental e, mais tarde, vai para destinos mais longínquos. Claro que há situações que começam pelo contrário, pelas imagens de sonho que as pessoas veem na televisão. Mas diria que as pessoas começam pelo que é mais próximo.
Novas tecnologias e desafios
Queria falar também sobre o impacto das tecnologias e da inteligência artificial nos cruzeiros. Que impacto poderá a inteligência artificial ter neste setor?Acho que a inteligência artificial vai ter um papel cada vez mais forte, vai ajudar na definição do perfil e na segmentação do cliente, ou seja, na forma como se chega ao potencial cliente, mas também na forma como o potencial cliente nos encontra e como todo esse processo de comunicação pode ser desenvolvido. Mas, na área do turismo de cruzeiros, estaremos seguramente numa fase inicial, como na generalidade do turismo, aliás, ninguém falava disto há dois anos. No nosso caso, por exemplo, estamos a criar um site de raiz, que vai ser lançado em breve, e que conta já com a parte de acesso de venda e distribuição de informação, receção dos vouchers e da documentação. Estamos a trabalhar muito nessa área e posso dizer que algumas das imagens que vão estar no site foram criadas por inteligência artificial. São imagens que foram criadas da forma como queríamos. Portanto, é algo útil, até ao nível da imagem. Acredito que vai ser algo importante para o futuro mas nunca vai retirar uma coisa que só nós temos, o sorriso que conseguimos ter e a emoção que conseguimos colocar nas coisas. Não vai substituir o contacto humano.
Para terminar, queria apenas perguntar se, com tantos desafios que o mundo está a viver, é possível que o turismo de cruzeiros venha a ser afetado? É difícil dizer, seguramente terá influência. Todos, quando acordamos e ligamos a televisão, somos surpreendidos com informação que às vezes espanta pela positiva e tantas vezes pela negativa. Às vezes, esperamos continuar num determinado caminho e, no dia seguinte, as coisas mudam de rumo. Portanto, não é fácil. Isto é um bocadinho, e falando de cruzeiros, uma questão de navegação à vista. Mas há outros desafios que são muito interessantes, como a sustentabilidade. Hoje os navios são cada vez mais sustentáveis, cada vez mais respeitadores do ambiente. Às vezes, pensamos que o turismo de cruzeiros polui muito mas não, o turismo de cruzeiros está na vanguarda.
E da parte dos clientes há essa preocupação? Não. São ótimos tópicos de venda e de marketing, mas não é por isso que o cliente escolhe determinado cruzeiro. Essa é a realidade e temos de encarar a realidade. Fiz a primeira viagem bio-LNG do mundo, uma saída de Amsterdão para Copenhaga no MSC Euríbea mas, comparando com outros navios, a verdade é que o passageiro não nota qualquer diferença. Mas esta é uma questão que, apesar de não ter nascido agora, só agora está a ser debatida. Tive a oportunidade, há uns anos, quando tinha o programa na SIC Notícias, de fazer um episódio só sobre sustentabilidade, quando o Allure of the Seas nasceu. De toda a imprensa que estava lá, fomos os únicos a falar sobre esse tópico. Era algo que ainda não estava na moda em 2010 ou 2011, mas a verdade é que as companhias estão a fazer o seu trabalho, até porque têm a responsabilidade de atingir net zero em 2050.
*Entrevista publicada originalmente na edição 1510 do Publituris.