Na recta final do processo de transposição da nova Directiva das Viagens Organizadas
Por Carlos Torres, advogado e Professor ESHTE / Católica Porto BS
Publituris
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1) No limite do prazo para a transposição de uma legislação fundamental para as agências de viagens mas que se projecta igualmente noutros sectores Em escassas semanas, porventura menos, o sector das agências de viagens terá de reflectir e expressar a sua posição sobre uma das mais importantes legislações de sempre da União Europeia, a Directiva 2015/2302/UE, de 25 de Novembro de 2015, que alarga extraordinariamente a figura da viagem organizada (englobando para além da tradicional brochura, a viagem por medida, pre-arranged / customised / click-through packages ou caixas-oferta) e cria a nova categoria dos serviços de viagem conexos. Também a hotelaria que combine alojamento e outro serviço v.g. golfe ou as companhias aéreas que somem ao transporte alojamento ou aluguer de viatura (fly drive), ficam submetidos à nova disciplina europeia, ou seja, um estatuto de verdadeiro e próprio operador turístico, designadamente a necessidade de assegurar a protecção dos clientes em caso de insolvência. Até 1 de Janeiro de 2018 a transposição da nova disciplina europeia deve estar publicada no Diário da República, em ordem a ser aplicada a partir de 1 de Julho (art.º 28º). Tempo escasso para um significativo conjunto de matérias atendendo a que não se conhece ainda entre nós o primeiro draft ou borrão da futura legislação. Espanha e França são outros países retardatários, diversamente do que sucede com outros Estados-membros como a Alemanha, Áustria, Luxemburgo ou Polónia em que a transposição já figura na folha oficial e as principais questões há muito debatidas.
2) Responsabilidade do Estado-membro pela não atempada ou incorrecta transposição de uma directiva O que acontece se um Estado-membro não transpuser dentro do prazo ou adequadamente uma directiva? No caso Dillenkofer (C-178/94 e outros), o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) determinou que a não atempada ou incorrecta transposição de uma directiva gera responsabilidade civil do Estado-membro perante os consumidores lesados pela falência de operadores turísticos.
Consequentemente a Alemanha foi condenada pela tardia transposição da Directiva de 1990, tendo de ressarcir os prejuízos dos consumidores prejudicados pela ausência de mecanismos de protecção da falência, no verão de 1993, de dois operadores turísticos. Deve também atender-se ao denominado efeito directo das directivas, ou seja, embora sendo um acto destinado aos países da UE, impondo-lhes o dever de transposição das normas europeias para os seus direitos nacionais, pode, em determinadas condições, gerar direitos para os particulares. O TJUE considerou que uma directiva tem um efeito directo quando as suas disposições são incondicionais e suficientemente claras e precisas naquelas situações em que o Estado-membro não a transpôs atempadamente (acórdão Van Duyn).
3) Viagens profissionais, opção pela responsabilização do retalhista e outras questões de relevo A forma como algumas questões são reivindicadas não contribuem para um bom resultado do processo de transposição, perdendo-se tempo desnecessariamente. É o caso da posição associativa segundo a qual as “viagens profissionais não são objecto de defesa por parte do legislador europeu, logo não poderão ser objecto de defesa no âmbito do direito português”. Não é uma posição aceitável porquanto a intenção clara e inequívoca do legislador europeu é de abranger as viagens profissionais. Para isso alargou inclusivamente o conceito de consumidor para viajante (considerando 7), não havendo, assim, forma de excluir este importante conjunto de viagens. Só estão excluídos os managed bussiness travel [art.º 2º/2/c)], mas certamente as grandes empresas que celebram acordos gerais para um elevado número de serviços por um período determinado tenderão a optar por outros modelos contratuais para que os seus funcionários não fiquem excluídos da protecção do novo quadro europeu. A opção de responsabilizar os retalhistas, decorrente do acordo APAVT/DECO, é de todo inadequada e iníqua como referi em anteriores artigos. Num mercado em que os operadores turísticos espanhóis têm um forte peso, em caso de insolvência de um deles o mecanismo de protecção contra os riscos da insolvência – individual ou colectivo, português ou espanhol – poderá invocar que o viajante deve reclamar o cumprimento dos serviços junto do outro responsável pela sua execução, o retalhista. Caberá a este último o repatriamento ou a devolução do preço da viagem não realizada, ou seja, arrastando um conjunto significativo de PMEs para a falência, num mais que expectável efeito dominó. Também numa situação de indemnização por dano moral de férias estragadas o retalhista pode vir a suportar este tipo de custos, que podem ser muito significativos. O viajante acciona judicialmente o operador mas a condenação só é proferida decorridos dois anos quando já foi decretada a sua insolvência. Ou então o viajante acciona desde logo operador e retalhista. Fichas informativas normalizadas alertam minuciosamente os viajantes para os seus reforçados direitos. Alterações no horário de partida ou de chegada podem motivar a rescisão pelo viajante, sem custos. Prevê-se igualmente o cancelamento sem penalização para o viajante em situações de guerra, terrorismo ou outros problemas sérios de segurança, catástrofes naturais (inundações ou terramotos), bem como condições meteorológicas que impossibilitem viajar em segurança e ainda surtos de doenças graves no destino. A possibilidade de cancelamento da viagem sem qualquer justificação por parte do viajante, ainda que na véspera da partida, – mediante o pagamento de uma simples taxa de rescisão adequada – é outro aspecto novo a considerar. O viajante pode reduzir o preço por má qualidade dos serviços que integram o package. Quando o contrato preveja que o preço pode aumentar – o viajante pode sempre rescindir sem penalização se o incremento for superior a 8% – em contrapartida também pode ser reduzido. Finalmente, as profundas alterações que têm de ser introduzidas no fundo de garantia. O TJUE já se pronunciou sobre a ilegal limitação de responsabilidade e o princípio da efectividade constante dos artigos 17º e 19º deverá ser observado. Terá o nosso legislador de assegurar a plena protecção dos viajantes (uma obrigação de resultado dos Estados-membros) em vez do limite anual de um milhão de euros, disponibilidade imediata das verbas para repatriamentos ou viagens não realizadas e que as contribuições correspondam a uma percentagem suficientemente alta e actualizada do volume de negócios do organizador.
*Por Carlos Torres, advogado e Professor ESHTE / Católica Porto BS
Artigo publicado no Publituris a 10 de Novembro.