A Irresponsabilidade das Taxas sobre os Turistas
Leia a opinião de Licínio Cunha, professor da Universidade Lusófona.
Publituris
AHP debate restrições à circulação de autocarros no centro histórico do Porto com a Câmara Municipal
Nova Edição: 50 anos da Marina de Vilamoura, estudo “Distribuição Turística”, ‘Espanha Verde’, Cuba, easyJet e Festuris
Edição Digital: 50 anos da Marina de Vilamoura, estudo “Distribuição Turística”, ‘Espanha Verde’, Cuba, easyJet e Festuris
Madeira recebe 11.ª edição dos World Golf Awards
Alunos das Escolas do Turismo de Portugal ganham medalhas internacionais
Universidade do Algarve recebe última sessão das conferências “Estratégia Turismo 2035 – Construir o Turismo do Futuro”
Turismo do Alentejo e Ribatejo aprova plano de atividade com acréscimo de 50%
Soltrópico anuncia novos charters para Enfidha no verão de 2025
Concorrência dá ‘luz verde’ à compra da Ritmos&Blues e Arena Atlântico pela Live Nation
Número de visitantes em Macau sobe 13,7% para mais de três milhões em outubro
A ideia de cobrar taxas aos turistas não é nova e tem sido aplicada em destinos turísticos de vários países, embora raramente. O próprio signatário, em contexto diferente, chegou a propor uma cobrança de uma taxa de estada aos turistas, mas com contornos e fins diferentes daqueles que a Câmara Municipal de Lisboa estabeleceu.
Assumindo a contradição, agora não a proporia por considerá-la irresponsável como a racionalidade e a experiência alheia o demonstram. Quer o presidente, quer o vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa, nas suas intervenções para justificar a criação das taxas de turismo (desembarque e de estada) garantiram, num primeiro tempo, que elas se destinavam a criar um fundo, porque a autarquia “tem necessidade de investir na atracção da cidade, nos museus e, em especial, num grande centro de congressos” e que, tratando-se de “pequenas taxas”, não afectam a competitividade do turismo de Lisboa”, pois são cobradas noutras cidades europeias. Acrescentaram ainda que a cobrança destas taxas será compensada pela redução do IRC e de IRS.
Pouco tempo depois, o vice-presidente anunciou que “a autarquia deu por terminada a possibilidade de financiar o novo centro de congressos” e que, agora, o fundo servirá para requalificar a estação Sul e Sueste e criar um espaço museológico dedicado às Descobertas (Expresso, 20-12-14).
Ou seja, foi decidido criar taxas sem se saber a sua finalidade a não ser a de ajudar a resolver o problema do défice das contas camarárias, o que se pretendeu escamotear camuflando o verdadeiro objectivo. Ou será que a estação Sul e Sueste é uma atracção turística, coisa que ninguém havia sonhado?
Estas afirmações suscitam inúmeras questões, que facilmente demonstram quão absurdas são, mas limitemo-nos às fundamentais que só por si são suficientes para evidenciar a irresponsabilidade da medida tomada.
Em primeiro lugar, o turismo receptor é uma exportação, por sinal a de maior vulto e significado do País, e nenhuma exportação é tributável. Justifica-se tanto cobrar taxas aos turistas, como cobrá-las às exportações de sapatos e vinhos.
Em segundo lugar, qualquer das taxas é discriminatória. Com efeito, quanto à taxa de estada, só os turistas que dormem em alojamentos controlados a pagarão mas, os restantes, que representam uma elevada percentagem, não. Por sua vez, a taxa de desembarque no aeroporto é inaceitável, porque o aeroporto da Portela não é um aeroporto regional de Lisboa, mas sim nacional e a CML não tem jurisdição sobre o mesmo. Porque é que um turista que, desembarcando no aeroporto, vai para Cascais, não visitando sequer Lisboa, tem de pagar uma taxa à CM desta cidade?
Em terceiro lugar, mais importante do que o resto, as taxas afectam significativamente a competitividade do turismo da capital. Desconhece-se qual o grau de reacção dos visitantes de Lisboa ao aumento dos preços (elasticidade-preço), mas basta ter presente que Portugal é dos países receptores da área do Mediterrâneo que será mais afectado pelo aumento dos preços por ter uma procura mais sensível a este aumento do que os seus concorrentes (os valores estão calculados). Isto significa que o aumento dos preços em 1% desvia a procura turística de Portugal para outros destinos numa proporção mais elevada.
Ora as “pequenas taxas” podem traduzir-se num aumento superior a 2% do preço do quarto duplo de um hotel (nalguns casos muito superior) e as consequências podem ser gravosas como o demonstram os exemplos de outros casos. Há vários, mas citamos apenas dois.
Quando o governo das Baleares lançou a taxa de 1€/dia sobre as dormidas, a procura dos principais clientes (alemães, britânicos, franceses e holandeses) diminuiu 1,44%, resultando numa perda para a economia turística local.
Consequência idêntica ocorreu no estado da Nova Gales do Sul quando o governo local lançou uma “bed tax”, em Sidney, por altura dos Jogos Olímpicos: o PIB do estado teve uma queda de 166,5 milhões de dólares e o emprego nos hotéis da cidade diminuiu 2,6%.
A CML nunca construiu qualquer atracção que aumentasse a atractividade da cidade e quando houve um projecto para alterar o estado deplorável do Parque Mayer, que por si só seria uma atracção, foi a própria autarquia que impediu a sua realização. Com as taxas, as Baleares queriam oferecer melhor ambiente e Sidney oferecia os Jogos Olímpicos, mas Lisboa oferece a melhoria da estação Sul e Sueste!
Por último, é extraordinária a afirmação de que as taxas criadas serão compensadas pela redução do IRC e do IRS. Serão compensadas? Como? Os turistas não pagam estes impostos em Portugal e nunca serão compensados. O que acontece, isso sim, é que passam a ser eles a pagar os impostos dos lisboetas e o que a CML faz é “exportar” os impostos dos seus munícipes. Poderá ser uma excelente ideia mas não deixa de ser um atentado contra o turismo que, por sinal, é uma das actividades económicas mais importantes da cidade.
Com o lançamento destas taxas haverá uma perda do turismo mesmo que não se dê por isso porque a procura turística é influenciada por outros factores. O número de dormidas na cidade pode não ser afectado, mas sê-lo-á o da hotelaria que perde competitividade. É uma afirmação facilmente demonstrável, mas o espaço não comporta explicações exaustivas.
O que se pretende é alertar as restantes autarquias do País para que o exemplo não seja seguido. É tentador, mas é preciso avaliar primeiro as consequências de uma irreflexão.
*Por Licínio Cunha, professor da Universidade Lusófona.